Para evitar alto custo econômico
e ambiental, países adotam rigor contra desperdício de alimentos.
Frequentadores de restaurantes chineses estão
postando fotos de pratos vazios online, pedindo a amigos que não peçam mais do
que podem comer. A Coreia do Sul está cobrando por peso pela coleta de lixo, na
esperança de persuadir as famílias a descartarem menos comida. Massachusetts
está proibindo grandes empresas de mandarem resíduos alimentares para aterros
sanitários, e os supermercados britânicos estão melhorando os rótulos e
embalagens para que os consumidores joguem menos fora o que comprarem.
A reportagem é de Beth Gardiner, publicada pelo The
New York Times e reproduzida pelo portal UOL,
25-04-2014.
Por todo o mundo, o desperdício de alimentos é
cada vez mais visto como um assunto econômico e ambiental sério. Com muitas
famílias com orçamento apertado e a população mundial crescendo a cada ano, há
uma crescente conscientização dos recursos desperdiçados na produção de
alimentos que nunca são comidos. Empresas, governos e ativistas estão
trabalhando para que mais do que é cultivado chegue às mesas, e menos às latas
de lixo.
A ONU estima que um terço de todo o alimento
produzido no mundo nunca é consumido, o que gera um total de cerca de 1,3
bilhão de toneladas de lixo por ano. Apenas nos Estados Unidos, cerca de 40% de
todos os alimentos, no valor estimado de US$ 165 bilhões, são jogados fora,
informou o Conselho de Defesa dos Recursos Naturais em 2012.
No mundo desenvolvido, os alimentos descartados
por varejistas e consumidores seriam mais que suficientes para alimentar os 870
milhões de pessoas com fome do mundo, disse José Graziano da Silva, diretor
geral da Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO),
no ano passado, ao apresentar a campanha antidesperdício Pense, Coma,
Economize, que a organização promove em conjunto com o Programa das Nações
Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA).
No Reino Unido, que conta com os dados mais
abrangentes disponíveis sobre alimentos descartados, cada família joga fora, em
média, 700 libras, ou US$ 1.170 , em alimentos por ano.
“Se você olhar para a história humana, fora os
muito ricos, as famílias sempre aproveitavam ao máximo a comida”, disse Richard
Swannell, diretor de sistemas sustentáveis de alimentos do Programa de Ação
para Recursos e Desperdício, ou Wrap (na sigla em inglês), a organização
britânica antidesperdício que compilou o número. “À medida que ficamos mais
prósperos, nós deixamos de nos preocupar com isso.”
As consequências ambientais do desperdício são
enormes, dizem os especialistas, com vastas quantidades de água, fertilizantes
e terras usadas para produção de alimentos que nunca são comidos, além da
energia usada para processá-los, refrigerá-los e transportá-los.
Os alimentos descartados que decompõem no aterro
sanitário, sem a presença de oxigênio, emitem metano, um potente gás do efeito
estufa.
Ao todo, esse lixo cria 3,3 bilhões de toneladas
de gases do efeito estufa anualmente, diz a FAO. Se o lixo alimentar fosse um
país, aponta a agência, ele seria o terceiro maior emissor de gases do efeito
estufa no mundo, atrás da China e dos Estados Unidos.
Nos países em desenvolvimento, o desperdício de
alimento começa a acontecer logo depois da colheita, enquanto as safras são
armazenadas ou transportadas, por causa de falta de refrigeração e boas
estradas, o que faz com que estraguem antes de chegar ao mercado. Nos países
mais ricos, o desperdício frequentemente começa com os varejistas descartando
itens que acham que não terão apelo aos consumidores. Mas a maior fonte
individual de desperdício está nos lares, estima o Wrap, onde cerca da metade
de todo o alimento não comido é descartado.
A organização tem buscado chamar a atenção para o
problema com sua campanha Ame a Comida, Odeio o Desperdício, que pede aos
consumidores que planejem antes das compras e congelem mais alimentos. As
pessoas devem confiar mais em seus olhos e narizes, aconselha a campanha, em
vez de apenas nas datas de validade para decidir se um alimento está estragado.
A organização está trabalhando com redes de
supermercados para reduzir o lixo, deixando as datas de validade mais claras,
vendendo porções menores e usando embalagem reutilizável para alimentos
perecíveis, como queijo ou legumes congelados.
Esses esforços ajudaram o Reino Unido a reduzir o
desperdício de alimentos em 21% desde 2007. É o único país na Europa que
conseguiu essa redução, disse Clementine O’Connor, consultora sênior da Bio
Intelligence Service, uma consultoria de sustentabilidade e empresa de auditoria
francesa de propriedade da Deloitte Touche Tohmatsu.
A Tesco, a primeira rede de supermercados
britânica a publicar seus números de descarte de alimentos, relatou que 28.500
toneladas de alimentos foram para o lixo em suas lojas e centros de distribuição
na primeira metade de 2013 –0,87% de seu volume de vendas. Mas isso é apenas
uma pequena fração do total de desperdício no país. Os alimentos jogados fora
com mais frequência são hortifrútis frescos e assados, disse George Gordon, um
porta-voz da Tesco. Alface embalado fica no topo da lista, ele disse, com 68%
da produção total descartados.
A rede está estudando os itens mais desperdiçados
e introduziu alface em embalagens com dois compartimentos, de modo que os
consumidores podem usar metade, enquanto a outra permanece fresca, disse
Gordon. A Tesco também está alterando alguns dos processos de fornecimento,
para que uvas, por exemplo, cheguem às lojas cinco ou 10 dias mais cedo, dando
mais tempo para os consumidores as consumirem, ele disse.
“Se você olhar para a cadeia de valor, da fazenda
à mesa, nós estamos bem no meio dela”, disse Gordon, reconhecendo que os
varejistas podem influenciar os fornecedores tanto quanto os consumidores. “Nós
estamos em uma posição útil.”
Na Coreia do Sul, um grande esforço para reduzir
os alimentos desperdiçados parte do governo. Na esperança de reduzir os
alimentos desperdiçados em 20%, o país introduziu um sistema que cobra por peso
a coleta do lixo.
Na China, uma campanha chamada Operação Prato
Limpo se tornou um sucesso nas redes sociais, com os frequentadores de
restaurantes postando fotos de seus pratos vazios. A campanha teria o apoio do
presidente Xi Jinping e, juntamente com os descontos “meia porção, metade do
preço” e outras medidas antidesperdício, tem recebido grande cobertura do
jornal “Diário do Povo”, porta-voz do Partido Comunista.
No mês passado, os líderes chineses emitiram um
memorando pedindo às autoridades que reduzam os banquetes fartos, instruindo
aos cafés dirigidos pelo governo que reduzam as porções e pedindo às empresas
da catering e restaurantes que facilitem para que os clientes peçam menos,
noticiou o agência de notícias oficial “Xinhua”. O governo também está
preparando uma nova lei para desperdício de alimentos, informou a agência.
A fome matou dezenas de milhões de pessoas na
China nos anos 60, mas Pan Wenjing, uma integrante do escritório em Pequim do
Greenpeace, disse que grande parte do país é jovem demais para lembrar daqueles
tempos. “A geração mais jovem realmente não sabe o que é fome”, ela disse.
Pan disse que os líderes chineses perceberam que
a redução do desperdício é crucial para a capacidade do país de alimentar a si
mesmo, uma tarefa que deverá se tornar mais difícil se a mudança climática
reduzir a produção agrícola, como esperam os especialistas.
Doug Rauch, o ex-presidente da rede americana de
mercados Trader Joe’s, está estudando pesquisas que mostram que alimentos além
de seu prazo de validade frequentemente ainda são seguros para consumo. Rauch
planeja abrir o Daily Table em Boston, no mês que vem, uma organização sem fins
lucrativos que estocará alimentos além do prazo de validade ou com embalagens
danificadas para venda para pessoas carentes.
O Estado de Massachusetts está exigindo que
qualquer instituição que jogue fora mais de uma tonelada de alimentos por
semana o use para compostagem. Uma regra semelhante entrará em vigor no ano que
vem em Nova York. Diferente dos aterros sanitários, o alimento que se decompõe
na compostagem não produz metano, porque o oxigênio está presente.
Na Grécia, a crise econômica também promoveu um
novo foco no lixo. Um grupo no país deu início a um centro online, para ajudar
pequenas lojas com excesso de alimentos a contatarem pessoas carentes nas
proximidades, disse O’Connor, da Bio Intelligence, que está trabalhando no
Fusions, um esforço para redução do desperdício de alimentos financiado pela
União Europeia. A união deseja reduzir pela metade o desperdício de alimentos
até 2020.
No Reino Unido, onde mais da metade das
autoridades locais coleta lixo alimentar para compostagem, também está
investindo em biodigestores, que usam lixo orgânico para gerar energia.
Um dos maiores desafios atuais é o alimento estar
ligado de modo inseparável à cultura, consequentemente tocando em questões
emocionais difíceis de mudar. “Trabalhar na questão do desperdício de alimentos
é muito delicado”, disse Fanny Demassieux, chefe da unidade responsável pelo
consumo do PNUMA.
“A ideia é não ser invasivo e dizer às pessoas o
que fazer”, ela disse. “É apenas explicar para elas que, provavelmente, elas
estão desperdiçando mais alimentos do que imaginam.”
Fonte: IHU On-line
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