Animais e plantas da Caatinga
também têm suas estratégias de convivência com o Semiárido.
Resistência da Caatinga também é uma
característica do povo da região onde o bioma está presente. Práticas
agroecológicas são uma forte estratégia de preservação do bioma.
Por Catarina de Angola – Asacom
Recife – PE
Caatinga é um bioma exclusivamente brasileiro.
| Foto: Romário Henrique
No dia 28 de abril foi comemorado o dia Caatinga,
bioma exclusivamente brasileiro, presente na região semiárida, e corresponde a
12% do território nacional. Caatinga vem do tupi-guarani e significa Mata
Branca, uma referência à paisagem que se forma nas épocas de estiagem, quando
as árvores perdem as folhas, como forma de resistir ao período de pouca água.
Essa característica de resistência é encontrada não apenas na flora, mas na
fauna e também no povo da região onde esse bioma está presente. “Nós somos um
povo muito resiliente. A gente se adéqua muito facilmente as adversidades. Além
da não acomodação, da proatividade, isso é muito característico nosso. De
inventar, de adequar, experimentar”, diz Alessandro Nunes, assessor técnico da
Cáritas Regional Ceará.
No entanto, apesar de sua riqueza, a Caatinga nem
sempre foi enxergada como importante para o país. O olhar sobre ela como bioma passa
a ser diferente a partir dos estudos do professor e pesquisador pernambucano
João Vasconcelos Sobrinho, falecido em 1989. A Caatinga era considerada
sinônimo de miséria e escassez de recursos ambientais, mas em seus estudos, ele
abordou a riqueza e diversidade, destacando as espécies exclusivas encontradas
unicamente no bioma. “A Caatinga tem a referência ligada à imagem
negativa da seca, mas isso na verdade foi construído com um propósito pela
classe dominante, que sempre se beneficiou das condições adversas do bioma e
reforçou a imagem negativa. Mas o povo catingueiro, desde que tenha seus
direitos respeitados e que possam exercer sua cidadania, não troca esse lugar
aqui por lugar nenhum”, afirma o bolsista do Núcleo de Desenvolvimento de
Tecnologias do Instituto Nacional do Semiárido (INSA), João Macêdo.
Além dos estudos de Vasconcelos Sobrinho, uma série
de iniciativas que se deram ao longo dos últimos anos, realizadas por diversas
organizações da sociedade civil, está dando visibilidade à Caatinga e suas
potencialidades e características específicas, levando em conta a resistência
do povo e articulando políticas e estratégias de convivência com o bioma.
E , se tratando de diversidade e resistência, a fauna da Caatinga tem um grande
potencial. Conclusão tirada pelos estudos do pesquisador colombiano Carlos
Arturo Navas. Ele está no Brasil há 20 anos estudando a Caatinga e se diz
fascinado com a diversidade do bioma e das estratégias que os animais se
utilizam para conviver com os períodos de estiagem, que são uma forte
característica da região semiárida.
Fauna e flora da Caatinga tem estratégias para
conviver com os períodos mais secos. | Foto: Ivan Melo
“Uma parte significativa da fauna da Caatinga passa
o período mais seco em uma situação de inatividade. Durante essa época de seca,
quando se anda pela Caatinga, se encontram menos animais por aí. Na verdade,
tem uma quantidade muito grande de animais que se encontra debaixo da terra,
com metabolismo reduzido. São milhares de indivíduos de diversas espécies que
estão aguardando as chuvas. Acho isso fascinante! É ciência pura entender como
é possível animais passarem nove meses inativos e como é possível, no caso de
anfíbios como sapos e pererecas, passar esse tempo embaixo da terra e ter a
capacidade da musculatura bastante preservada”, explica.
O pesquisador, que também é professor titular do
departamento de fisiologia do Instituto de Biociências da Universidade de São
Paulo, coloca também a importância de que observar os movimentos da natureza é
importante para a preservação das vidas na região. “Na fauna, existem ainda
espécies que são especialistas em buscar água, pequenos resquícios de umidade.
Já outras buscam microclimas específicos, procurando condições mais amenas.
Vale a pena olhar esse conhecimento natural para aprender com ele também”,
pontua o pesquisador.
Observar esse movimento é o que faz o agricultor
Antônio Braga Mota, 42, da comunidade de Bueno, em Irauçuba, no Ceará. O
município está em uma das áreas mais emblemáticas com relação ao processo de
desertificação no país. E é nesse contexto que seu Antônio, mais conhecido como
Toinho, há sete anos tem conseguido, a partir de práticas agroecológicas,
recuperar o solo e reverter o processo de desertificação. “Eu deixo a matéria
orgânica no solo, que fica coberta, faço a diversificação de culturas e não
queimo mais. Isso faz com que a terra não fique descoberta e traz mais proteção
para ela”, afirma o agricultor.
Ele também tem uma área que preserva diversas
plantas nativas da Caatinga, também como estratégia de combater o avanço do
processo de desertificação e reconhece que a produção agroecológica também
contribui para uma alimentação saudável. “Hoje eu tenho além do milho e feijão,
que são comuns na região, várias fruteiras, outros tipos de feijão, palma e meu
quintal produtivo. Mas aqui na região não é todo mundo que cuida da terra não”,
conta, lembrando que nos tempos em que a Caatinga era preservada havia uma
quantidade maior de animais como onças e veados, além de mais pontos de água,
como riachos.
Caatinga tem grande diversidade de cores
em
Para Alessandro, a experiência agroecológica de seu
Toinho e diversos outros agricultores e agricultoras do Semiárido contribuem
para a preservação e resistência da Caatinga. “A agroecologia e a convivência
com o Semiárido trabalham na perspectiva de ter uma região com condições
ambientais, sociais e políticas muito mais estruturadas. E a agroecologia é um
modelo de desenvolvimento que de fato tem como enfrentar todas essas questões
do processo de desertificação e das mudanças climáticas. Pois ela trabalha com
o uso adequado do solo, o manejo adequado da água e a produção de alimentos
saudáveis, sem utilização de agroquímicos”.
“Os sistemas agroflorestais têm uma resiliência
fantástica para essa crise colocada pelas secas prolongadas. A gente sabe que o
impacto da seca foi menor para os agricultores que tem práticas agroecológicas
do que os de sistema convencional”, afirma Rivaneide Lígia, coordenadora local
do Centro Sabiá no Sertão de Pernambuco.
Mesmo com toda essa diversidade biológica e com
diversas experiências que se utilizam do potencial da Caatinga e ao mesmo tempo
preservam sua fauna e flora, o bioma não é reconhecido como Patrimônio
Nacional, a mesma coisa acontece com o Cerrado, outro bioma presente na região
semiárida. Para rever essa questão, está em tramitação na Câmara dos Deputados
o Projeto de Emenda Constitucional 504/10, que elevam a Caatinga e o Cerrado a
Patrimônios Nacionais presentes na Constituição Federal. “Quando conseguirmos
esse reconhecimento para a Caatinga teremos políticas mais amarradas e mais
definidas para preservação do bioma e para as populações que a ocupam”, explica
João Macedo.
Olhares da Caatinga – No Dia Nacional da Caatinga, a
Articulação Semiárido Brasileiro (ASA) lançou exposição fotográfica virtual
Olhares da Caatinga, de autoria coletiva da rede, que apresenta diversos
olhares da fauna e da flora da Caatinga. A proposta revela as belezas e
singularidades deste bioma que ensina muito sobre a convivência com as
características do Semiárido. As imagens são de autoria de comunicadores e
comunicadoras, técnicos e técnicas e jovens que convivem com o bioma e fazem
parte da ASA. Para acessar a exposição é só entrar na página da ASA no
Facebook:
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