Mosquitos transgênicos aqui de
Juazeiro, artigo de Roberto Malvezzi (Gogó).
Foto: Moscamed / DW
Está sendo divulgado em nível nacional, como
absoluto sucesso, a soltura de mosquitos transgênicos do Aedes Aegypti, como
forma de combate à dengue, aqui na cidade de Juazeiro da Bahia. Os números
dizem que no “bairro de Mandacaru a incidência da dengue caiu 90%”. No bairro
do Itaberaba também.
Em primeiro, Mandacaru é um distrito de
irrigação, está afastado do centro urbano de Juazeiro. Itaberaba é dos muitos bairros
pobres e insalubres da cidade, para onde vieram milhares de trabalhadores da
cana e da fruticultura irrigada.
O caso tem sido comentado em nível mundial porque
a soltura dos mosquitos – aqui trabalho feito pela Moscamed, mas que traz a
larva da empresa britânica Oxitec – foi feito sem os cuidados da precaução. O
macho é geneticamente modificado em laboratório, copula com a fêmea e as larvas
dessa fêmea morrem. É bom lembrar que as primeiras experiências foram feitas em
regiões do Caribe e aqui agora nas periferias de Juazeiro. Portanto, lugares
pobres e de terceiro mundo. Enfim, somos cobaias dessa experiência.
O caso já foi dado como sucesso e a CTNBio já
liberou a experiência para todo território nacional.
Eu que sou morador da cidade – imagino que também
muitos outros cidadãos juazeirenses – estou me perguntando se essa experiência
pode mesmo ser considerada o sucesso propalado.
Nunca tivemos tantos mosquitos na cidade – e olha
que sempre tivemos em nuvens – como estamos tendo agora. Nas manifestações de
julho do ano passado a massa que subiu a ponte que une Juazeiro à Petrolina
carregava mosquiteiros na cabeça para protestar contra a praga que devora a
cidade. Alguns bares abertos colocaram mosquiteiros nas mesas para que as
pessoas pudessem sentar-se ali e beber sua cerveja. Uma pizzaria da cidade,
também com um espaço aberto, oferece repelentes para os fregueses passarem no
corpo e assim poderem comer suas pizzas em paz.
Será que a solução está mesmo na transgenia? Ou é
o saneamento? Como não ter mosquito numa cidade que não tem saneamento básico,
cujos bairros com até 30 mil pessoas tem o esgoto correndo a céu aberto? Claro
que precisamos nos livrar da dengue, mas ela não é o único problema da cidade,
já que existem uma quantidade enorme de outros mosquitos – muriçoca, muruin,
etc. – que fazem um inferno em nossas casas e nos espaço públicos.
Nem vamos falar do impacto da transgenia na
natureza. Será mesmo que a proliferação dos outros mosquitos na cidade nada tem
a ver com a soltura do Aedes transgênico ? E os demais possíveis desequilíbrios
ambientais foram efetivamente avaliados?
Enfim, seria preciso muito mais cuidado e
ampliação do leque de informações, da situação como um todo, para que a CNTBIO
decidisse o que já decidiu. Isso é muito bom para empresas, para o poder
público que pode lavar as mãos diante do inferno que é viver numa nuvem de
mosquitos numa cidade sem saneamento. Para o povo, a solução ainda está por
vir.
Roberto Malvezzi (Gogó), Articulista do Portal EcoDebate,
possui formação em Filosofia, Teologia e Estudos Sociais. Atua na Equipe
CPP/CPT do São Francisco.
Fonte: EcoDebate
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