Países ricos também devem cumprir
novos objetivos de desenvolvimento.
Torneiras públicas
em Blantyre, em Malawi. Ativistas afirmam que a água e o saneamento deveriam
ser um objetivo em si mesmo na agenda de desenvolvimento posterior a 2015.
Foto: Charles Mpaka/IPS.
Nações Unidas, 18/7/2014 – A Organização das Nações
Unidas (ONU) discute um novo conjunto de Objetivos de Desenvolvimento
Sustentável (ODS) que substituirá os oito Objetivos de Desenvolvimento do
Milênio (ODM), cujo cumprimento vence no final de 2015. Os novos ODS propostos,
cerca de 17 ou mais, serão uma parte integral da agenda de desenvolvimento da
ONU posterior a 2015, que, entre outras coisas, busca erradicar da face da
Terra a extrema pobreza e a fome até 2030.
Neeli Kroes, da Comissão Europeia, órgão executivo
da União Europeia (UE), disse que a nova agenda das Nações Unidas foi descrita
como o “empreendimento em matéria de desenvolvimento mais completo e de maior
alcance jamais assumido pela ONU em toda sua história”. Mas Jen Martens, diretor
da organização Global Policy Forum (Fórum de Políticas Mundiais), disse à IPS
que, no geral, a atual lista de objetivos e metas propostos não constitui uma
resposta adequada às crises social, econômica e ambiental que o mundo enfrenta,
nem à necessidade de uma mudança fundamental.
Os ODS propostos contêm uma mescla de velhos
compromissos reciclados e de novos vagamente formulados, como o que diz:
“assegurar a mobilização significativa de recursos de uma variedade de fontes
para oferecer os meios adequados e previsíveis a fim de implantar programas e
políticas para erradicar a pobreza em todas suas dimensões”, afirmou Martens.
Especialistas em desenvolvimento coincidem em que
as nações ricas praticamente não conseguiram cumprir suas obrigações
relacionadas com o oitavo dos ODM, que exorta a “fomentar uma aliança mundial
para o desenvolvimento” com os países do Sul em desenvolvimento. O Centro do
Sul, com sede em Genebra, recomenda: “Os ODS não devem ser um conjunto de
objetivos a serem perseguidos apenas pelas nações em desenvolvimento como se
fosse um tipo de condição ou de novas obrigações”.
O documento final da Rio+20, como é conhecida a
Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável realizada no
Brasil em 2012, especifica que as novas metas devem “ser aplicadas de forma
universal a todos os países”, inclusive aos de economias ricas. Os 17 novos
objetivos, redigidos por um grupo de trabalho aberto, inclui propostas para
erradicar a fome e a pobreza, conseguir vidas saudáveis, oferecer uma educação
de qualidade, conseguir a igualdade de gênero e reduzir as desigualdades.
Também prevê o uso sustentável da água e o
saneamento, energia para todos, emprego produtivo, industrialização, proteção
dos ecossistemas terrestres e fortalecimento da aliança global para o
desenvolvimento sustentável. O grupo de trabalho encerra hoje sua 13ª rodada de
negociações, provavelmente a última, após a qual deverá elaborar um relatório e
apresentá-lo à Assembleia Geral da ONU em agosto. Depois, os governantes dos países
membros deverão aprovar o conjunto dos objetivos em setembro do próximo ano.
Até então, segundo disse um alto oficial da ONU que pediu para não ser
identificado, “poderá haver um monte de acréscimos e eliminações”.
Martens, que monitorou as 12 últimas sessões de do
grupo de trabalho, apontou à IPS que os governos não devem repetir o erro
cometido com o oitavo ODM sobre a “aliança mundial”, cuja formulação foi tão
vaga que não implicou nenhum compromisso vinculante para o Norte industrial. “O
que necessitamos são objetivos quantificáveis para os ricos”, opinou.
A agenda posterior a 2015 deve abordar os
obstáculos estruturais e as barreiras políticas que impediram o cumprimento dos
ODM, como o comércio injusto e as normas de investimento (incluindo o mecanismo
de resolução de disputas) e os problemas da evasão e fraude fiscais das
transnacionais e das pessoas mais ricas. “Por que não propormos acabar com
todos os paraísos fiscais até 2020?, perguntou.
As organizações não governamentais criticaram muito
que a água e o saneamento não tenham formado um “objetivo em si mesmo” nos ODM
e só foram uma meta secundária do sétimo: “garantir a sustentabilidade do
ambiente”.
Nadya Kassam, diretora de campanhas da organização
WaterAid, com sede em Londres, afirmou à IPS: “acreditamos que a água e o
saneamento devem ser um objetivo em si mesmo depois de 2015, e até onde podemos
ver, resulta alentador”. É impensável não incluir esses temas nem a higiene,
que são fundamentais para alcançar outros, como o de boa saúde, educação,
crescimento econômico, acrescentou. O sueco Jan Eliasson, subsecretário-geral
da ONU, deixou clara a importância do saneamento com sua campanha para
erradicar a defecação ao ar livre, que WaterAid integra.
Depois de quase 15 anos desde que foram acordados
os ODM, foi alcançado o objetivo de reduzir pela metade a proporção de pessoas
sem água potável. Mas na África subsaariana 36% da população ainda não tem
acesso a esse recurso. Kassam ressaltou que o acesso ao saneamento continua
muito atrasado e, no ritmo atual, a região vai demorar 150 anos só para
conseguir a meta prevista nos ODM, que estão por expirar. “Assim, a água, e em
particular o saneamento, têm de ser de primordial importância para o futuro”,
acrescentou.
Martens disse que é um sinal positivo um dos
objetivos propostos nos ODS seja reduzir a igualdade dentro e entre os países.
“É de vital importância que este objetivo não se perca na fase final das
negociações”, acrescentou. Mas não será suficiente apenas com um objetivo sobre
desigualdade; cada ODS deveria ter metas e indicadores sobre a distribuição e a
desigualdade, afirmou.
A organização Repórteres Sem Fronteiras divulgou um
comunicado no dia 14, indicando que houve um “acalorado debate, com a oposição
de alguns integrantes da equipe de trabalho, como Rússia, Cuba e China”, a
respeito de um dos ODS sobre informação e meios de comunicação. A proteção de
direito à informação corre risco de ser debilitada ou desaparecer de todo e
poderia ser substituída por uma vaga referência à liberdade de expressão,
acrescenta a nota.
Na Cúpula do Milênio, realizada em Nova York, em
setembro de 2000, 189 Estados membros da ONU adotaram a Declaração do Milênio
com base em vários documentos surgidos de diferentes conferências
internacionais na década anterior e que tratavam sobre população, direitos
humanos, ambiente, habitat e desenvolvimento social. Depois, em agosto de 2001,
a secretaria da ONU adotou os oito ODM.
Na ocasião, os objetivos não foram redigidos pelos
governos por meio de um debate aberto, mas por um comitê criado a partir de
vários órgãos da ONU, como Banco Mundial, Fundo Monetário Internacional, Fundo
das Nações Unidas para a Infância, Fundo de População das Nações Unidas,
Organização Mundial da Saúde e Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento
Econômicos. Os ODM tampouco foram objeto de uma resolução formal da Assembleia
Geral.
As metas pretendiam reduzir pela metade a proporção
de pessoas que vivem na indigência e sofrem fome, conseguir a educação primária
universal, promover a igualdade de gênero, reduzir a mortalidade infantil em
dois terços e a materna em três quartos, entre 1990 e 2015. Também propunham
lutar contra a expansão do vírus HIV, causador da aids, a malária e outras
enfermidades, garantir a sustentabilidade ambiental e gerar uma aliança mundial
para o desenvolvimento entre o Norte e o Sul. Envolverde/IPS (IPS).
Fonte: ENVOLVERDE
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