terça-feira, 22 de julho de 2014

Países ricos também devem cumprir novos objetivos de desenvolvimento.
Torneiras públicas em Blantyre, em Malawi. Ativistas afirmam que a água e o saneamento deveriam ser um objetivo em si mesmo na agenda de desenvolvimento posterior a 2015. Foto: Charles Mpaka/IPS.

Nações Unidas, 18/7/2014 – A Organização das Nações Unidas (ONU) discute um novo conjunto de Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) que substituirá os oito Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM), cujo cumprimento vence no final de 2015. Os novos ODS propostos, cerca de 17 ou mais, serão uma parte integral da agenda de desenvolvimento da ONU posterior a 2015, que, entre outras coisas, busca erradicar da face da Terra a extrema pobreza e a fome até 2030.

Neeli Kroes, da Comissão Europeia, órgão executivo da União Europeia (UE), disse que a nova agenda das Nações Unidas foi descrita como o “empreendimento em matéria de desenvolvimento mais completo e de maior alcance jamais assumido pela ONU em toda sua história”. Mas Jen Martens, diretor da organização Global Policy Forum (Fórum de Políticas Mundiais), disse à IPS que, no geral, a atual lista de objetivos e metas propostos não constitui uma resposta adequada às crises social, econômica e ambiental que o mundo enfrenta, nem à necessidade de uma mudança fundamental.

Os ODS propostos contêm uma mescla de velhos compromissos reciclados e de novos vagamente formulados, como o que diz: “assegurar a mobilização significativa de recursos de uma variedade de fontes para oferecer os meios adequados e previsíveis a fim de implantar programas e políticas para erradicar a pobreza em todas suas dimensões”, afirmou Martens.

Especialistas em desenvolvimento coincidem em que as nações ricas praticamente não conseguiram cumprir suas obrigações relacionadas com o oitavo dos ODM, que exorta a “fomentar uma aliança mundial para o desenvolvimento” com os países do Sul em desenvolvimento. O Centro do Sul, com sede em Genebra, recomenda: “Os ODS não devem ser um conjunto de objetivos a serem perseguidos apenas pelas nações em desenvolvimento como se fosse um tipo de condição ou de novas obrigações”.

O documento final da Rio+20, como é conhecida a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável realizada no Brasil em 2012, especifica que as novas metas devem “ser aplicadas de forma universal a todos os países”, inclusive aos de economias ricas. Os 17 novos objetivos, redigidos por um grupo de trabalho aberto, inclui propostas para erradicar a fome e a pobreza, conseguir vidas saudáveis, oferecer uma educação de qualidade, conseguir a igualdade de gênero e reduzir as desigualdades.

Também prevê o uso sustentável da água e o saneamento, energia para todos, emprego produtivo, industrialização, proteção dos ecossistemas terrestres e fortalecimento da aliança global para o desenvolvimento sustentável. O grupo de trabalho encerra hoje sua 13ª rodada de negociações, provavelmente a última, após a qual deverá elaborar um relatório e apresentá-lo à Assembleia Geral da ONU em agosto. Depois, os governantes dos países membros deverão aprovar o conjunto dos objetivos em setembro do próximo ano. Até então, segundo disse um alto oficial da ONU que pediu para não ser identificado, “poderá haver um monte de acréscimos e eliminações”.

Martens, que monitorou as 12 últimas sessões de do grupo de trabalho, apontou à IPS que os governos não devem repetir o erro cometido com o oitavo ODM sobre a “aliança mundial”, cuja formulação foi tão vaga que não implicou nenhum compromisso vinculante para o Norte industrial. “O que necessitamos são objetivos quantificáveis para os ricos”, opinou.

A agenda posterior a 2015 deve abordar os obstáculos estruturais e as barreiras políticas que impediram o cumprimento dos ODM, como o comércio injusto e as normas de investimento (incluindo o mecanismo de resolução de disputas) e os problemas da evasão e fraude fiscais das transnacionais e das pessoas mais ricas. “Por que não propormos acabar com todos os paraísos fiscais até 2020?, perguntou.

As organizações não governamentais criticaram muito que a água e o saneamento não tenham formado um “objetivo em si mesmo” nos ODM e só foram uma meta secundária do sétimo: “garantir a sustentabilidade do ambiente”.

Nadya Kassam, diretora de campanhas da organização WaterAid, com sede em Londres, afirmou à IPS: “acreditamos que a água e o saneamento devem ser um objetivo em si mesmo depois de 2015, e até onde podemos ver, resulta alentador”. É impensável não incluir esses temas nem a higiene, que são fundamentais para alcançar outros, como o de boa saúde, educação, crescimento econômico, acrescentou. O sueco Jan Eliasson, subsecretário-geral da ONU, deixou clara a importância do saneamento com sua campanha para erradicar a defecação ao ar livre, que WaterAid integra.

Depois de quase 15 anos desde que foram acordados os ODM, foi alcançado o objetivo de reduzir pela metade a proporção de pessoas sem água potável. Mas na África subsaariana 36% da população ainda não tem acesso a esse recurso. Kassam ressaltou que o acesso ao saneamento continua muito atrasado e, no ritmo atual, a região vai demorar 150 anos só para conseguir a meta prevista nos ODM, que estão por expirar. “Assim, a água, e em particular o saneamento, têm de ser de primordial importância para o futuro”, acrescentou.
Martens disse que é um sinal positivo um dos objetivos propostos nos ODS seja reduzir a igualdade dentro e entre os países. “É de vital importância que este objetivo não se perca na fase final das negociações”, acrescentou. Mas não será suficiente apenas com um objetivo sobre desigualdade; cada ODS deveria ter metas e indicadores sobre a distribuição e a desigualdade, afirmou.

A organização Repórteres Sem Fronteiras divulgou um comunicado no dia 14, indicando que houve um “acalorado debate, com a oposição de alguns integrantes da equipe de trabalho, como Rússia, Cuba e China”, a respeito de um dos ODS sobre informação e meios de comunicação. A proteção de direito à informação corre risco de ser debilitada ou desaparecer de todo e poderia ser substituída por uma vaga referência à liberdade de expressão, acrescenta a nota.

Na Cúpula do Milênio, realizada em Nova York, em setembro de 2000, 189 Estados membros da ONU adotaram a Declaração do Milênio com base em vários documentos surgidos de diferentes conferências internacionais na década anterior e que tratavam sobre população, direitos humanos, ambiente, habitat e desenvolvimento social. Depois, em agosto de 2001, a secretaria da ONU adotou os oito ODM.

Na ocasião, os objetivos não foram redigidos pelos governos por meio de um debate aberto, mas por um comitê criado a partir de vários órgãos da ONU, como Banco Mundial, Fundo Monetário Internacional, Fundo das Nações Unidas para a Infância, Fundo de População das Nações Unidas, Organização Mundial da Saúde e Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômicos. Os ODM tampouco foram objeto de uma resolução formal da Assembleia Geral.

As metas pretendiam reduzir pela metade a proporção de pessoas que vivem na indigência e sofrem fome, conseguir a educação primária universal, promover a igualdade de gênero, reduzir a mortalidade infantil em dois terços e a materna em três quartos, entre 1990 e 2015. Também propunham lutar contra a expansão do vírus HIV, causador da aids, a malária e outras enfermidades, garantir a sustentabilidade ambiental e gerar uma aliança mundial para o desenvolvimento entre o Norte e o Sul. Envolverde/IPS (IPS).

Fonte: ENVOLVERDE

Nenhum comentário:

Postar um comentário