E achamos que não é conosco,
artigo de Bruno Peron.
Algumas bocas sinceras dizem que um dos motivos
pelos quais Estados Unidos não ratificou o Protocolo de Quioto (que prescreve
metas de redução de gases que prejudicam o meio ambiente) é o receio de entravar
alguns setores de sua economia. Talvez se refiram às indústrias estadunidenses
que poluem o ar, a água e o solo. Por analogia, é possível deduzir que o Brasil
só não acaba com o desmatamento de uma vez por causa da expansão descontrolada
da agricultura e da pecuária no interior.
No entanto, a Organização das Nações Unidas (ONU) declarou recentemente que
tais setores agrícola e pecuário no Brasil encontraram maneiras de prosperar
sem desmatar. Este ritmo de sustentabilidade une-se ao elogio da ONU,
durante uma reunião sobre mudanças climáticas em 5 de junho de 2014, aos
esforços do Brasil no combate ao desmatamento e na redução da emissão de gases
que causam efeito estufa.
O Brasil é um caso emblemático para a ONU devido
à extensão territorial colossal da Amazônia e do papel “emergente” que algumas
lideranças brasileiras creem que o país tem nas relações internacionais. A ONU
comparou o caso do Brasil com os de países africanos, asiáticos e
sul-americanos.
É verdade que algumas situações de desmatamento
se devem a mudanças climáticas que prolongam o período de secas. No Brasil,
porém, está claro que nosso desmatamento tem origem num modelo de
desenvolvimento econômico corrosivo e predador. Sustentabilidade é uma roupa
nova que esconde um corpo sujo. Desse modo, os que mais falam de
sustentabilidade são os que menos fazem para conquistá-la.
O pronunciamento da ONU de que a intensidade do
desmatamento tem diminuído no Brasil é alentador, mas digo que o cenário
ambiental ainda é preocupantemente grave neste país. Matas extensas
transformam-se em glebas para agricultura e pastos para pecuária. Mas não num passe
de mágica. Logo, a diminuição do ritmo de desmatamento não é um convite à
comemoração porque árvores continuam sendo derrubadas.
Não há dúvida de que duas medidas governamentais
têm tido efeitos positivos: demarcação de terras de proteção ambiental e punição
a empresas que desmatam para explorar tais áreas. As advertências, leis e
medidas do governo fortalecem-se, mas dependem também do consentimento de
empreendedores e neo-bandeirantes.
É necessário que os brasileiros nos desenvolvamos
com todo respeito à natureza e ao próximo. E não é só porque a ONU se
pronunciou ou pela mensagem de outro organismo internacional que o Brasil segue
nos Twits do desenvolvimento. Basta observar que mais tiramos que repomos,
poucas cidades brasileiras têm planos de reciclagem de lixo, e nossas
metrópoles expandem-se com pouca arborização.
Temos assim santuários florestais virgens, de um
lado, e zonas urbanas sedentas de expansão descontrolada, de outro. O encontro
entre estas duas entidades (a natural e a humana), cedo ou tarde, ocorre
através de uma sustentabilidade fraudulenta.
Por fim, aproveito para finalizar este artigo
recordando ao leitor que o Brasil se impõe metas ambiciosas. Uma delas é a de
reduzir o desmatamento em 80% nos próximos seis anos. As florestas suspiram de
alívio. A ONU regozija-se. Agricultores e pecuaristas são lançados contra a
parede. E nós meio-cidadãos achamos que não é conosco.
Fonte: EcoDebate
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