Gestão de Unidades de Conservação
deveria ter maior participação social.
por
Fernanda B. Müller, do CarbonoBrasil
Foto: Acervo CarbonoBrasil
Evento sobre áreas protegidas e inclusão social
aponta que é preciso harmonização das políticas públicas nacionais para
permitir maior integração entre a natureza e a sociedade.
Não apenas a participação, mas também o
protagonismo das comunidades locais na proteção dos ecossistemas são
considerados essenciais para que a conservação seja efetiva.
Esse foi o consenso entre pesquisadores e
representantes do setor público e da sociedade civil que estiveram reunidos em
Florianópolis na última quinta-feira (14) no evento preparatório para o
Seminário sobre Áreas Protegidas e Inclusão Social (SAPIS), que será realizado
no ano que vem na mesma cidade. Casos de sucesso e números apresentados durante
o evento corroboram esta opinião.
Durante o painel de abertura, Iara Vasco Ferreira,
analista ambiental do Centro Nacional de Pesquisa e Conservação da
Sócio-biodiversidade Associada a Povos e Comunidades Tradicionais (CNPT) do
ICMBio, comentou sobre o intenso processo de construção do Sistema Nacional de
Unidades de Conservação(SNUC), que levou mais de dez anos para ser aprovado
após a mobilização de vários setores da sociedade.
O SNUC categoriza as áreas de proteção em integral
e em uso sustentável, com diferentes níveis de integração e interação com as
populações residentes e do entorno das Unidades de Conservação (UCs).
Ferreira apresentou dados de um relatório da IUCN sobre as
áreas protegidas na América Latina (2011) e alertou sobre o quão longe estamos
do que seria o ideal, segundo as metas, por exemplo, da Convenção sobre
Diversidade Biológica.
Apenas 10,4% da superfície terrestre e míseros 2,1%
da superfície marinha da América Latina estão em áreas protegidas. No Brasil, a
situação é pior, com 9% e 0,3%, respectivamente, protegidos sob o SNUC.
Ferreira trabalhou na elaboração do Plano Nacional
de Áreas Protegidas (PNAP), documento que define objetivos, metas e estratégias
até 2015 para integração e manejo de UCs, terras indígenas e quilombolas e
outras áreas protegidas. Ou seja, o prazo está se esgotando.
A implantação do PNAP é urgente, considerando a
quantidade de conflitos que travam o processo de implantação das UCs. Porém, a
iniciativa parece estar engavetada em Brasília, apontou a professora Marta
Irving da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Por seu caráter interministerial e transversal, que
envolveu três esferas de governo e a sociedade civil organizada, o PNAP suscita
a integração das políticas públicas nacionais, aponta o MMA em seu portal.
E é esta integração que foi criticada pela
professora Irving. Ela classificou como “esquizofrênicas as regras do governo,
que conflitam entre si”, além de “existir um hiato muito grande entre o que
dizem as políticas públicas e a sua implantação”, especialmente no que se
refere à participação social.
“Houve um avanço impressionante na política pública,
mas um retrocesso nas decisões políticas e na implantação”, afirmou.
A pesquisadora questiona o modelo de “clara cisão”
entre a sociedade e a natureza, um equívoco que ela defende que seja
desconstruído, mas que está na “base da política pública”. Ela defende que haja
uma reintegração entre natureza e sociedade.
Certamente que uma das áreas mais propensas a
iniciar esta ‘reintegração’ são as UC, que regem o ritmo de vida das populações
que vivem em seu interior, no caso das UCs de Uso Sustentável, ou em seu
entorno.
Participação direta
Um espaço criado pelo SNUC onde a sociedade pode
participar efetivamente do dia-a-dia da UC são os Conselhos Gestores.
Ferreira enfatiza que o Conselho é o fator que
democratiza o processo de gestão e, de fato, sendo deliberativo ou consultivo –
o que varia dependendo da categoria de UC – isto tem sido visto com bons olhos
tanto pelo poder público quanto pelas comunidades.
Daniel Castro, do ICMBio, apontou que o órgão vem
realizando um trabalho intenso para formar e aprimorar os Conselhos das UCs
nacionais. Nas quase 300 UCs, sessenta e nove foram instituídos desde 2011,
sendo que 100% das Reservas Extrativistas têm conselhos.
Os números do ICMBio mostram que a maior parte está
trabalhando em seu regimento interno, já que foram formados há pouco tempo.
Na prática, além de envolver e instigar as
comunidades, os conselhos acabam sendo uma forma de dividir tarefas que o órgão
não conseguiria executar sozinho devido ao efetivo baixo em muitas áreas.
“Essas interações e parcerias são muito
importantes”, ressalta Castro, ponderando que os conselhos ainda estão
engatinhando e que é preciso a sua capacitação.
“Para os gestores, está claro que quando se começa
a trazer as comunidades para o debate, a efetividade é muito maior”, disse ele.
Maria Aparecida Ferreira, conhecida como Cidinha,
representante da comunidade de pesca de Ibiraquera no Conselho da Área de
Proteção Ambiental (APA) da Baleia Franca e secretaria de articulação política
e mediação do Conselho Nacional de Fortalecimento das Reservas Extrativistas
Costeiras e Marinhas (CONFREM), completou que a população não deve apenas
criticar, mas sim participar.
“Na APA da Baleia Franca, fomos capacitados, mas
queríamos ser. Foi um Conselho construído e não apresentado”, comentou, completando
que o conselho foi de tal forma fortalecido com a participação popular que o
seu caráter consultivo acabou sendo, na prática, muito mais deliberativo.
Além do conselho da APA, Cidinha contribuiu para a
constituição da RESEX da Pesca Artesanal de Imbituba e Garopaba e está
trabalhando para a criação das RESEX do Cabo de Santa Marta e
Ibiraquera/Encantada.
“A gente só culpa o ICMBio, o estado, mas você,
está fazendo a sua parte?”, incitou Cidinha.
O evento preparatório para o SAPIS foi organizado por
diversos setores da UFSC e pelo Coletivo UC da Ilha, e é preparatório ao VII
SAPIS e II ELAPIS, eventos que ocorrerão em Florianópolis em 2015.
Fonte: CarbonoBrasil
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