Disputa pela água em São Paulo
revela descaso com os rios.
A seca
que afeta drasticamente a região Sudeste e acirra a disputa por água entre São
Paulo e Rio de Janeiro expõe a fragilidade e o desmonte do Sistema Nacional de
Recursos Hídricos no Brasil, associada à incapacidade da Agência Nacional de
Águas para promover a gestão compartilhada da água, dirimir conflitos e
garantir o acesso à população.
A disputa por água que teve início neste ano entre
as Regiões Metropolitanas de São Paulo e Piracicaba – e agora se agrava entre
os Estados da região Sudeste – revela também o descaso com os rios e como a
falta de investimentos em saneamento básico aumentam a crise. A escassez de
água na região Sudeste não se deve apenas à super exploração e ao clima, é decorrente
também da poluição dos rios por falta de tratamento de esgoto, do baixo
controle de efluentes industriais e do uso de defensivos agrícolas.
A poluição e o desperdício agravaram o impacto da
seca e a disputa pelos poucos mananciais que apresentam qualidade de água boa.
Refém do setor elétrico há décadas, o sistema de
recursos hídricos, implementado há 17 anos no Brasil justamente para buscar o
uso racional da água e o enfrentamento de crises, estabelece que a gestão da
água deve ser compartilhada entre a União e os Estados. E o planejamento
estratégico, a definição dos usos prioritários e a tomada de decisão deve se
dar por bacia hidrográfica, com a participação da sociedade e dos usuários
públicos e privados, nos Comitês de Bacias Hidrográficas.
Apesar da legislação de recursos hídricos ser
considera avançada e reconhecida no cenário internacional, o conflito com o
setor elétrico é antigo e tem se sobreposto à gestão da água. A ANEEL, agência
reguladora do setor energético, toma decisões de forma centralizada, enquanto
que a ANA, agência reguladora da água, atua de forma compartilhada com os
órgãos gestores dos Estados e seus sistemas de gerenciamento de recursos
hídricos.
Essa diferença essencial no modelo de gestão,
somada ao privilégio e poder de um setor em detrimento do outro, tem
representado na prática o enfraquecimento do Sistema de Recursos Hídricos na
esfera federal e nos Estados.
Passadas quase duas décadas da Lei de Recursos
Hídricos (9433/97), apenas oito comitês de bacias hidrográficas foram implantados
em rios interestaduais, de domínio da União. Dentre eles, os mais antigos e
atuantes são justamente os dos rios Paraíba do Sul e o Piracicaba, Capavari e
Jundiaí, que estão no centro da crise. Outros 141 Comitês de Bacias estão
instalados e em funcionamento nos Estados.
Deixar que a tomada de decisão em relação ao uso ou
a reservação dos volumes de água do Rio Jaguari paulista ou do Jaguari mineiro,
formador do Sistema Cantareira, se dê por decisão política nos Estados ou de
forma unilateral pela ANA será um enorme retrocesso. Pois nem cariocas nem
paulistas podem ficar sem água para abastecimento humano por conta do setor
elétrico ou da necessidade de uso de água desses rios para diluição de esgotos.
Neste momento de crise, esperamos que a ANA e os
Governadores de São Paulo e do Rio de Janeiro reconheçam os Comitês de Bacias
para planejamento e tomada de decisão. É preciso tratar a gestão da água de
forma estratégica e integrada com a priorização de investimentos em saneamento
básico, na despoluição dos rios e na recuperação e conservação de matas
essenciais para que possamos garantir água em quantidade e qualidade nos
próximos anos.
* Malu Ribeiro é coordenadora da Rede das
Águas da Fundação SOS Mata Atlântica.
Fonte: SOS Mata Atlântica
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