Governo precisa de plano nacional
de adaptação às mudanças climáticas, diz Observatório do Clima.
O coordenador-geral do Observatório do Clima (OC
– rede de organizações não governamentais e movimentos sociais brasileiros que
atuam na agenda de mudanças climáticas no país), André Ferretti, disse ontem
(31) à Agência Brasil que o governo federal necessita ter um plano nacional de
adaptação para enfrentar as consequências do aquecimento global.
Segundo Ferretti, o novo relatório do Painel
Intergovernamental da Organização das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas
(IPCC), divulgado hoje e que trata dos impactos, adaptação e vulnerabilidade às
mudanças climáticas, mostra de forma clara que o mundo ainda não consegue
calcular quanto isso vai custar aos países. A estimativa é que os custos
oscilem entre US$ 4 bilhões e mais de US$ 100 bilhões nos 40 anos compreendidos
entre 2010 e 2050. “Essa variação mostra a grande dificuldade de se calcular,
porque são muitos fatores envolvidos”, disse.
Ferretti sublinhou que, quando se fala em
impactos e adaptação, é preciso que o país saiba quais são as suas
vulnerabilidades, “mapeá-las e traçar planos para reduzi-las”. Ele explicou que
como o mundo ainda não traçou esse mapa, fica difícil estimar quanto vai custar
para se adaptar às mudanças que estão em curso e àquelas que virão.
Por isso, Ferretti indicou que o Observatório do
Clima (OC) considera fundamental que o Brasil tenha um plano nacional de
adaptação. A demanda da ONG é antiga e ganha cada vez mais força, destacou. “O
relatório [do IPCC] evidencia que é urgente a necessidade de um plano e é
estratégico para qualquer país, conhecendo os seus pontos mais vulneráveis, se
preparar para essa adaptação”. Segundo Ferretti, é em função da qualidade dessa
adaptação que o governo poderá saber se haverá mais prejuízos sociais,
econômicos e ambientais em decorrência das mudanças do clima.
Ferretti sugeriu que uma das estratégias mais
eficientes e baratas é a adaptação baseada em ecossistemas. Isso significa
manter os ecossistemas funcionando em boa qualidade, para que os serviços
ambientais essenciais continuem sendo providos. No caso brasileiro, em
especial, ele destacou a energia hidrelétrica, da qual o país é dependente e
está enfrentando problemas de falta de água nos reservatórios em um período que
deveria ser de chuvas abundantes. ”Eventos como esse vão ser cada vez mais
frequentes e intensos, segundo as previsões do segundo relatório do IPCC. E a
gente sabe que além de sofrer com a falta de água em algumas épocas, a água que
é usada para o abastecimento vai gerar também problemas de abastecimento de
energia”, acredita.
O coordenador-geral do OC indicou que no plano
nacional de adaptação, o governo precisa identificar os principais mananciais
que estão sendo usados atualmente pela população, mas também os mananciais que
serão usados no futuro próximo, devido à demanda crescente, “e protegê-los,
conservá-los, também com isso melhorando a qualidade e a vida útil das nossas
represas”. Dessa forma, ele diz que o país consegue ter um sistema de
fornecimento de água e de energia mais eficiente.
Ferretti ponderou, entretanto, que, mesmo assim,
o país estará vulnerável e não poderá focar os investimentos somente em energia
hidrelétrica, mas deve investir também, com mais intensidade, em outras fontes
renováveis que não agravem as mudanças climáticas, entre as quais a energia
solar e a eólica (dos ventos). Ele lembrou que no ano passado, o governo
federal apresentou o seu plano setorial de mitigação e adaptação às mudanças
climáticas para o setor de energia. “E a gente vê que esse plano investe,
basicamente, 70% dos recursos até 2020 em combustíveis fósseis, o que é uma
contradição. Tem que ser justamente o contrário. Aliás, não tinha que ter
investimento nenhum nisso. Tinha que ter investimento em [combustíveis] não
fósseis”, opinou.
Outra questão que preocupa a ONG é o desmatamento
existente no Brasil que, depois de recuar os índices nos últimos anos, voltou a
aumentar na Amazônia, em 2013. “É um sério problema”. Ferretti defende que o
objetivo é que o Brasil caminhe para o desmatamento zero. “Temos que conservar
os ecossistemas, funcionando e garantindo os serviços ambientais essenciais
para a população”.
Na avaliação do coordenador do OC, o Brasil
precisa ser mais ousado e trilhar, em caráter definitivo, o caminho rumo a uma
economia descarbonizada, com investimentos direcionados a tudo que seja limpo
de carbono e possa trazer um diferencial para o país, em termos de novas
oportunidades, novos empregos e negócios. “É o que o mundo vai precisar nos
próximos anos. Se a gente ficar com essa fixação em pré-sal, a gente vai estar
desenvolvendo nosso país nos próximos anos para uma energia de que o mundo vai
precisar abrir mão”, salientou. “Se o Brasil insistir no petróleo, certamente
sofrerá pressão no futuro para não jogar isso na atmosfera”.
No próximo dia 29 de abril, o OC levará suas
sugestões sobre o Plano Nacional de Adaptação às Mudanças Climáticas à reunião
do grupo executivo da Comissão Interministerial de Mudanças Climáticas. Em outubro,
após o lançamento dos relatórios completos do IPCC, a ONG pretende divulgar o
sistema de estimativas de emissões de gases de efeito estufa do Brasil, em que
analisa as emissões do país no ano anterior. No ano passado, foram calculadas
as emissões de cada setor da economia. “Este ano, nós vamos revisar isso e, com
os dados dos relatórios do IPCC, nós vamos preparar todo um material para levar
ao governo”.
Ferretti também coordena as estratégias de
conservação da Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza.
Fonte: Agência Brasil
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