segunda-feira, 7 de abril de 2014

Brasil deveria iniciar racionamento de energia desde já, defendem especialistas.
Com níveis dos reservatórios historicamente baixos, analistas do setor afirmam que melhor opção seria uma redução voluntária de 5% no consumo de energia para evitar, no futuro, repetição do que ocorreu em 2002.
A usina hidrelétrica de Itaipú

O Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) informou nesta quarta-feira (02/04) que os reservatórios das hidrelétricas das regiões Sudeste e Centro-Oeste – responsáveis pela geração de 70% da energia consumida no país – estão com 36% da capacidade máxima. E admitiu que, se não chegarem a 43% no final de abril, o resto do ano será complicado.

A preocupação existe, e o governo parece não conseguir esconder. Em entrevista ao jornal americano Wall Street Journal no final de março, o ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, chegou a dizer que, caso as reservas das hidrelétricas não aumentassem nos próximos meses, o governo iria pedir à população que reduzisse o consumo de energia.

A declaração de Lobão logo foi desmentida pelo Planalto. Mas especialistas dizem que racionamento não é apenas uma possibilidade real, como também, se aplicada de forma gradual desde já, poderia evitar problemas mais sérios no final do ano – a exemplo do que aconteceu em 2002, quando o governo se viu forçado a decretar duras medidas para reduzir o consumo.

“Mesmo com o período de chuvas ao longo do mês de março, os reservatórios dessas regiões subiram somente 1,7%, num mês em que se esperava que o nível fosse aumentar muito mais”, diz Cláudio Sales, presidente do Instituto Acende Brasil, especializado no sistema elétrico brasileiro. “Dificilmente podemos esperar que a chuva seja tão forte e traga os reservatórios para o patamar de 43%”.

Racionamento gradativo

Por essa razão, especialistas ouvidos pela DW são unânimes em afirmar que o governo federal já deveria incentivar desde agora uma redução voluntária de pelo menos 5% de energia. Assim, consumidores residenciais e empresas não seriam atingidos de surpresa, no fim do ano, por um racionamento de 20% ou mais.

“O governo deveria se comunicar melhor com a sociedade para que ela tenha clareza e possa se mobilizar na direção da economia de energia”, diz Sales. “Isso é uma crítica que faço ao governo: ele continua tentando dar a entender que tem segurança absoluta com relação ao abastecimento, coisa que os números provam o contrário.”
Em 2002, governo se viu forçado a decretar duras medidas para reduzir consumo.

Para Roberto Schäffer, professor de planejamento energético da Coppe/UFRJ, o Brasil está entrando numa zona perigosa. Segundo ele, a situação atual está exigindo que o governo federal acione as usinas térmicas em níveis mais elevados do que até agora, já que os reservatórios estão mais baixos do que historicamente estariam nesta época do ano.

“Neste momento, a chance de faltar energia no Brasil é maior do que nos anos anteriores. Parece pouco provável que exista um racionamento ou falta de energia antes ou durante a Copa do Mundo. O que me preocupa mais é o período após o Mundial”, afirma Schäffer. “Eventualmente o Brasil quer passar uma impressão internacional de que está tudo bem, mas depois do Mundial devem vir medidas mais duras.”

Termelétricas: custo elevado

Com os reservatórios das hidrelétricas baixos e o sistema elétrico operando no limite, o governo vem sendo forçado a usar com mais frequência as termelétricas, que costumam ser acionadas apenas sazonalmente e são mais caras e poluentes.

Atualmente, mais de 17.500 dos 21.670 megawatts disponíveis nas termelétricas estão em operação. De acordo com Ildo Luís Sauer, diretor do Instituto de Energia e Ambiente da Universidade de São Paulo (USP), o custo da energia proveniente das usinas hidrelétricas e eólicas é de cerca de 100 reais por megawatt-hora (MWh). Já nas termelétricas, o valor ultrapassa os 800 reais por MWh.

“Isso gera um elevado custo para o país. São bilhões de reais sendo gastos em combustíveis, como óleo diesel e gás natural importado, num momento de estresse no mercado mundial”, diz Sauer. “Além disso, há o problema das emissões ambientais elevadas por causa da queima desses combustíveis. O alto custo esvazia recursos do Tesouro Nacional que deveriam ser destinados a outras prioridades”.

Como os custos extras estão ficando maiores, é provável que o Tesouro Nacional fique com a parcela mais elevada do uso da energia termelétrica e, assim, o repasse para o consumidor final seja menor. É possível, porém, que a parcela do uso das térmicas em 2013 – ao custo de cerca 9,5 bilhões de reais – e de 2014 – que deverá ultrapassar o valor do ano anterior – seja repassada aos usuários a partir de 2015.

“Se não chover o suficiente até agosto, toma-se a medida drástica de realizar o racionamento ou então tenta-se empurrar para depois das eleições presidenciais [em outubro]”, afirma Sauer. “O grande fiasco já foi concretizado, que é o mau planejamento e a má gestão do sistema.”

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