quinta-feira, 17 de abril de 2014

Ex-ministro alemão diz que Dilma bloqueou fim do acordo nuclear Brasil-Alemanha.
Cooperação iniciada na ditadura militar quase foi encerrada em 2004, por iniciativa dos então ministros dos Meio Ambiente Jürgen Trittin e Marina Silva. Dilma, na época chefe de Minas e Energia, teria barrado anulação.
As usinas nucleares de Angra 1 e Angra 2, no Rio de Janeiro

O polêmico Acordo Nuclear Brasil-Alemanha, base para a construção das usinas nucleares em Angra dos Reis, estava perto de ser encerrado em 2004 e hoje continua em vigor, afirmou nesta terça-feira (08/04) o político do Partido Verde Jürgen Trittin, na época ministro alemão do Meio Ambiente.

Durante um debate em Berlim sobre a ditadura militar brasileira, Trittin lembrou um episódio daquele ano. Segundo ele, a então ministra de Minas e Energia, Dilma Rousseff, interferiu nas negociações que poderiam levar ao fim do acordo.

“Na época, eu e a Marina Silva [então ministra do Meio Ambiente] estávamos seguindo a mesma linha”, contou Trittin, cujo partido é contra energia atômica. “No entanto, outra ministra, chamada Dilma Rousseff, tinha uma ideia totalmente diferente do que estávamos discutindo e pressionou para outro acordo ser assinado.”

Questionado pela plateia porque ele, como ministro, não encerrou unilateralmente o acordo, Trittin respondeu que o Partido Verde fazia parte de um governo de coalizão com os social-democratas e era difícil chegar a um consenso interno sobre o tema.

Trittin fez um apelo para que o atual governo alemão ponha um fim à colaboração entre os dois países na área nuclear: “Temos de reconhecer a responsabilidade da Alemanha perante o mundo e falar que não vamos mais cooperar nesse tema.”
Whitaker, Lisboa, Bartelt e Trittin durante debate em Berlim

“Considero praticamente impossível que o governo brasileiro encerre esse acordo”, disse Chico Whitaker, da Coalizão por um Brasil Livre de Usinas Nucleares.

Para ele, um dos empecilhos para a anulação do acordo está na posição da presidente Dilma Rousseff. “É muito difícil ir contra o pensamento tecnocrático de Dilma”, disse ele à DW. “Para ela, que veio do Ministério de Minas e Energia, é complicado ir contra essa política.”

Segundo Whitaker, alguns setores do governo até gostariam de resolver a questão, mas ainda falta coragem para a maioria se manifestar contra o pacto. “O pedido que fazemos ao governo alemão é que não se iniba em quebrar unilateralmente esse acordo.”

Dois pesos, duas medidas

O polêmico acordo nuclear assinado por Brasil e Alemanha em 1975, durante o regime militar, e seus riscos e consequências para a sociedade brasileira foram discutidos num debate da série Brasilientage.

A vigência inicial era de 15 anos, podendo ser prorrogada automaticamente por períodos de cinco anos caso não fosse encerrada por nenhuma das partes. Desde então, o acordo já foi prorrogado quatro vezes e deve ser renovado por mais meia década em novembro de 2015. Para o acordo ser anulado, uma das partes precisa manifestar seu desejo de cancelamento com pelo menos um ano de antecedência.

Durante uma acalorada discussão, ativistas do setor energético do Brasil afirmaram acreditar que não há vontade política por parte de Brasília para encerrar o pacto. Sendo assim, eles fizeram um apelo para que a Alemanha anule, de maneira unilateral, o acordo.

O mediador do debate, o chefe do escritório brasileiro da Fundação Heinrich Böll, Dawid Bartelt, acusou o governo alemão de ter uma política de dois pesos e duas medidas em relação à sua estratégia energética.

“Enquanto a Alemanha proibiu o funcionamento das usinas nucleares dentro de suas fronteiras, o governo ainda mantém a estratégia de exportação desse tipo de energia, e é por isso que esse acordo com o Brasil não é rescindido”, disse Bartelt. “O governo alemão deveria se envergonhar de agir assim”, completou.

Whitaker criticou a política energética brasileira, qualificando-a de “opaca”, e disse que os militares ainda estão no controle do programa nuclear brasileiro. “A política energética no Brasil é insana”, avaliou o ativista.

A socióloga Marijane Lisboa, uma das organizadoras do Brasilientage, cobrou uma resposta do governo da chanceler federal Angela Merkel. “A Alemanha tem parte da responsabilidade de qualquer acidente nuclear que venha a acontecer no Brasil”, disse.

Brasilientage

Os 50 anos do golpe de 1964, que transformou o Brasil numa ditadura militar por mais de duas décadas, estão sendo lembrados com uma série de eventos no Brasil e na Alemanha até o fim do ano.

De março a novembro, o grupo teuto-brasileiro Nunca Mais – Nie Wieder organiza seminários, debates, ciclos de palestras, exposições de arte e mostras de filmes e documentários em ambos os países.

O evento terá um encerramento simultâneo, em novembro, em Berlim e São Paulo. A ideia dos organizadores é que o fim das atividades coincida com a entrega do relatório final da Comissão Nacional da Verdade.

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