Vai faltar água, artigo de
Montserrat Martins.
No Dia Mundial da Água, saibam as novas gerações
urbanas que já nasceram sob o gosto ruim das águas de torneiras, mas nem sempre
foi assim. Sinal dos tempos, de uma crise anunciada: esta semana, os estados de
São Paulo e Rio de Janeiro entraram em conflito pelo abastecimento de água. A
falta de água e sua perda de qualidade são uma crise anunciada “para o futuro”
que já está batendo na porta.
Vai faltar água para a região metropolitana de
São Paulo e o plano emergencial é o bombeamento a partir do rio Paraíba do Sul.
Acontece que esse rio passa por uma vasta extensão do estado do Rio de Janeiro
e dele dependem 11 milhões de habitantes de lá, que seriam afetados pelo
bombeamento para a capital paulista. Já o governador de São Paulo foi ao
governo federal em busca de solução, pois diz que sem o bombeamento haverá
racionamento de água na região metropolitana.
Os bairros de periferia costumam ser vítimas da
negligência na manutenção de suas redes de distribuição a ponto de faltar água
em suas regiões. Revoltantes negligências, mas que podem ser sanadas por obras
das prefeituras. Já a crise de abastecimento, a falta de água para as regiões
metropolitanas, não tem soluções fáceis nem locais – está aí o conflito de São
Paulo e Rio de Janeiro por um rio, análogo ao de regiões desérticas onde já há
guerras pelos reservatórios naturais de água.
País rico em recursos naturais, com 11% da água
doce de todo o planeta, é um absurdo total a crise de abastecimento das
cidades, prova maior de nossa ignorância com o que nos é mais essencial. O
Brasil é um paraíso hídrico totalmente negligente com seu patrimônio ambiental,
que está degradando rapidamente – tanto os recursos hídricos quanto os
florestais, pois somos o país campeão mundial de desmatamento e não falamos
disso, como se o mais importante fosse o mundial de futebol.
Metade dos brasileiros ainda não tem esgoto
tratado. Empresas poluem rios das regiões metropolitanas, sem tratamento
adequado dos resíduos e sem fiscalização eficiente dos órgãos públicos.
Governos e iniciativa privada são parceiros nessa negligência para a qual a
sociedade ainda não acordou. A grande ausente nas manifestações de junho de
2013 – onde se gritou sobre a importância da saúde, educação e mobilidade – foi
a consciência ambiental.
É um problema mundial, não só nosso, é claro. A
ONU estima que mais da metade dos rios do mundo está poluída pelos despejos dos
esgotos domésticos, efluentes industriais e agrotóxicos. No Terceiro Mundo,
nove em cada dez litros de esgoto são lançados nos rios sem tratamento. Mas a
Europa também vive no limite dos seus recursos naturais, que historicamente
degradou bem antes da nossa era de consciência científica ecológica.
Poucos sabem que o conceito de “Desenvolvimento
Sustentável” não foi obra de ambientalistas mas sim de uma comissão de assuntos
econômicos da ONU, na década de 70, quando os europeus identificaram que o
grande gargalo para o desenvolvimento econômico era o esgotamento dos recursos
naturais.
A grande questão é que não existem soluções
imediatistas para problemas que requerem planejamento, prevenção e preservação.
Não há como restituir rios às suas condições originais, nem abastecer
metrópoles da noite para o dia. Quer dizer, vai faltar água e vai piorar a qualidade,
até faltar. E quando formos protestar será tarde, porque as medidas a tomar
levam décadas para surtir efeito. Ao contrário do que estamos fazendo, não
falar no assunto não resolve o problema, só adia as soluções.
Montserrat
Martins, Colunista do Portal EcoDebate, é Psiquiatra.
Fonte: EcoDebate
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