Novos materiais podem realizar
fotossíntese artificial para a produção de energia.
Pesquisadores da Unicamp desenvolvem
moléculas de clorofila artificial capazes de usar energia solar e água para
gerar hidrogênio e oxigênio; estudo foi apresentado em evento na Inglaterra
(imagem de cloroplastos de planta: Wikimedia)
A capacidade de fotossíntese das plantas tem servido de inspiração para cientistas de diferentes áreas tentarem produzir em laboratório materiais artificiais com propriedades semelhantes.
Um grupo de pesquisadores do Instituto de Química
(IQ) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), por exemplo, desenvolve
materiais com estrutura em escala nanométrica (bilionésima parte do metro)
capazes de realizar fotossíntese artificialmente para a produção de energia.
Alguns dos resultados desses estudos foram
apresentados na terça-feira (25/02) no UK-Brazil-Chile Frontiers of Science.
Organizado pela Royal Society, do Reino Unido, em conjunto com a FAPESP e as
Academias Brasileira e Chilena de Ciências, o evento ocorre até esta
quarta-feira (26/02) em Chicheley, no sul da Inglaterra. O objetivo é fomentar
a colaboração científica e interdisciplinar entre jovens pesquisadores
brasileiros, chilenos e do Reino Unido em áreas de fronteira do conhecimento.
“Com base no conhecimento existente do sistema
natural de fotossíntese realizado pelas plantas, estamos tentando reproduzir os
pontos essenciais para a função fotossintética em materiais artificiais, para
energia elétrica ou até mesmo combustível a partir da energia solar”, disse
Jackson Dirceu Megiatto Júnior, professor do IQ da Unicamp, à Agência FAPESP.
De acordo com o pesquisador, que realizou
doutorado direto com Bolsa da FAPESP, a ideia de realizar fotossíntese
artificial foi proposta no início do século XX.
O projeto, contudo, só começou a se tornar
possível nos últimos anos em razão de importantes avanços na área, que
permitiram a síntese em laboratório de materiais capazes de usar energia solar
e água para gerar gases hidrogênio e oxigênio, segundo Megiatto.
Alguns desses avanços foram o desenvolvimento de
materiais catalisadores (que aceleram uma reação) que, ao serem ativados pela
energia solar, quebram as moléculas de água em hidrogênio e oxigênio.
Essa etapa do processo de fotossíntese é considerada
a mais complexa, uma vez que os átomos de hidrogênio e oxigênio estão bastante
“grudados” nas moléculas de água. Por essa razão, era difícil encontrar um
material capaz de separá-los seletivamente, sem se degradar.
Mas recentemente foram desenvolvidos novos
materiais, como painéis solares de silício, com a capacidade de realizar esse
processo denominado de “separação da água induzida pela luz solar”. Com isso,
de acordo com Megiatto, abriu-se a perspectiva de conectar esses materiais
fotoativos a células a combustível convencionais – células eletroquímicas que
convertem energia química em elétrica ao combinar os gases hidrogênio e
oxigênio para formar moléculas de água novamente.
“O desafio agora é conectar esses materiais a uma
célula a combustível. Se formos capazes de usar o hidrogênio e o oxigênio
produzidos por esses novos materiais em uma célula a combustível, será possível
gerar água novamente e eletricidade e fechar o ciclo de realização de
fotossíntese artificial”, avaliou.
Materiais naturais
De acordo com Megiatto, algumas das limitações
para utilizar painéis solares de silício para separar hidrogênio e oxigênio das
moléculas de água por meio da energia solar é que são materiais caros e
difíceis de serem processados para que tenham a pureza necessária a essa
finalidade.
A fim de encontrar uma alternativa, os
pesquisadores do Instituto de Química da Unicamp buscam na própria natureza
materiais capazes de absorver a luz solar e gerar energia (fotovoltaicos), que
também funcionem como catalisadores.
O material mais promissor encontrado foi a
clorofila – o pigmento fotossintético que, além de conferir a cor verde, é
utilizado pelas plantas para realizar fotossíntese.
“Essas moléculas são a saída da natureza para
conseguir absorver energia solar. O processo de sintetização química delas, no
entanto, é difícil e caro”, disse Megiatto.
Para transpor essas barreiras, o pesquisador
começou a sintetizar durante seu pós-doutorado, realizado nos Estados Unidos,
moléculas de uma clorofila artificial, chamadas de porfirinas.
Além de mais simples de serem sintetizadas do que
a clorofila natural, as moléculas artificiais do pigmento também são mais
fáceis de serem manipuladas quimicamente, disse Megiatto.
“Temos uma flexibilidade muito maior de projetar
materiais fotoativos usando porfirinas em vez de clorofila”, afirmou o
pesquisador. “Com técnicas de nanoengenharia, podemos otimizar as propriedades
dessas moléculas para aumentar a eficiência delas de absorver a luz, por
exemplo”, indicou.
Outra vantagem da clorofila artificial, de acordo
com Megiatto, é a maior estabilidade química das porfirinas. As moléculas de
clorofila natural, quando estão dentro do meio proteico da fotossíntese
natural, são estáveis. Ao extraí-las do meio proteico, no entanto, apresentam
reações físico-químicas e são degradadas rapidamente.
Já a porfirina tem uma tendência menor a
apresentar esse tipo de comportamento, comparou o pesquisador.
“Esses materiais, quando conectados a
catalisadores, têm se mostrado muito promissores para a transformação da
energia solar em energia química por meio da oxidação de moléculas de água,
mas, no momento, estão sendo estudados apenas em solução aquosa e não em um
dispositivo fotossintético real”, afirmou Megiatto.
“O que tentamos fazer agora é formar um filme
polimérico fotoativo com essas moléculas, de forma a desenvolver um material
sólido e depositá-los sobre placas metálicas e semicondutoras [eletrodos],
necessários para o funcionamento de uma célula solar”, detalhou.
Aumento da eficiência da fotossíntese
Segundo Megiatto, as plantas desperdiçam grande
quantidade de energia solar durante o processo fotossintético natural. Como
depende de energia para uma série de necessidades, como para seu
desenvolvimento e manutenção da vida, a cana-de-açúcar, por exemplo, só utiliza
uma pequena parte da energia solar para fixar gás carbônico em açúcares,
apontou.
“A eficiência máxima da fotossíntese natural é,
aproximadamente, 10%”, afirmou Megiatto. “Plantas terrestres têm eficiência
fotossintética menor do que 1%, enquanto algumas algas são capazes de realizar
fotossíntese com uma eficiência que varia entre 4% e 5%.”
Para aumentar a eficiência da fotossíntese de
plantas como o arroz, por exemplo, o consórcio internacional de pesquisa “Arroz
C4”, financiado pela Fundação Bill e Melinda Gates, pelo Instituto
Internacional de Pesquisa do Arroz (IRRI, na sigla em inglês) e por
instituições de pesquisa do Reino Unido, pretende realizar modificações
genéticas no metabolismo da cultura agrícola.
O arroz e outros grãos, como a soja e o feijão,
são denominados de plantas C3 por apresentar maior capacidade de crescimento e
menor eficiência fotossintética do que as plantas C4, como o milho e a
cana-de-açúcar. Em contrapartida, as plantas C4 possuem sistema fotossintético
mais eficiente, mas menor capacidade de crescer rapidamente e cobrir grandes
áreas de cultivo como fazem as plantas C3 .
Por meio de mudanças em rotas bioquímicas e na
anatomia das folhas da planta, os pesquisadores participantes do consórcio
pretendem desenvolver uma variedade de arroz que combine as propriedades das
plantas C3 e C4.
“Uma variedade de arroz com as propriedades das
plantas C3 e C4 teria a eficiência fotossintética, de uso de água e de
nitrogênio 50% maior do que uma variedade não modificada geneticamente”, disse
Sarah Covshoff, pesquisadora da University of Cambridge e participante do
projeto “Arroz C4”, durante palestra em Chicheley.
Segundo Covshoff, o desenvolvimento da variedade
de arroz com as propriedades fotossintéticas das plantas C4 irá se valer do
avanço de técnicas da biologia sintética. O objetivo do consórcio internacional
de pesquisa é ter um protótipo do arroz C4 até o final de 2016.
“Os conhecimentos adquiridos nesse projeto também
poderão ser aplicados na pesquisa agrícola para aumento do rendimento de
plantas utilizadas para produção de biocombustíveis”, afirmou.
Fonte: Agência
FAPESP
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