Quase 40% da água tratada se perdem
antes de chegar ao consumidor no Brasil.
Desperdício acontece entre saída da estação de
tratamento e chegada às residências. Em algumas regiões do Norte, perda chega a
até 70%. Entre as principais razões, vazamentos na rede e transbordamento de
reservatórios.
No centro mais populoso do Brasil, São Paulo, uma
força-tarefa tenta manter a normalidade no fornecimento de água. Em março, o
Sistema Cantareira, que abastece metade da população da região metropolitana da
capital, registrou o menor índice nos reservatórios desde 1974, quando o
complexo começou a funcionar. Governos e operadoras apelam ao consumidor e
oferecem bônus para quem economizar em casa.
Mas não é o consumidor comum o maior responsável
pelo desperdício de água limpa, e sim as operadoras do serviço. A maior perda
acontece antes mesmo de a água tratada chegar às casas. Atualmente, em média,
38,8% da água é perdida entre a saída da estação de tratamento e a entrada nas
casas.
“Não sabemos exatamente onde e como”, diz Osvaldo
Garcia, secretário nacional de Saneamento Ambiental do Ministério das Cidades,
sobre o desperdício. “Fica a cargo de cada prestadora e da agência reguladora
de cada região analisar o seu desempenho.”
Os números do desperdício são de 2011. Anualmente,
operadoras do serviço enviam seus dados ao Sistema Nacional de Informação de
Saneamento (SNIS), que compila as informações. A declaração dos números por
parte das empresas não é compulsória. “É obrigatório da seguinte maneira: quem
não envia dados não tem acesso a verbas federais”, complementa Garcia.
Os números do ano passado estão em fase final de
análise e devem ser divulgados em abril. A expectativa é de que o desperdício
caia para 37%. Um índice ainda elevado. “Mas os números estão em queda. Em
2006, era de 43,8%”, aponta Garcia.
Líder em desperdício
Reservatórios no país chegaram aos níveis mais baixos já registrados
“Apesar da redução, esses valores continuam altos.
Em Tóquio, essa perda está em torno de 7%”, critica Wilson de Figueiredo Jardim,
coordenador do Laboratório de Química Ambiental da Universidade Estadual de
Campinas (Unicamp). Enquanto no Brasil, o volume perdido chega a 70% em algumas
cidades da região Norte.
Mesmo se a economia feita pela população for
significativa, a quantidade pouco deve refletir no nível dos reservatórios,
lembra Jardim. O comportamento brasileiro segue a tendência mundial: o consumo
doméstico de água representa apenas 8% da demanda mundial. A liderança do
ranking é da agricultura – a atividade econômica é responsável por 72% da água
consumida no país.
Segundo o SNIS, 91% dos municípios brasileiros
enviaram ao órgão os dados sobre desperdício. Para especialistas que acompanham
o setor, no entanto, os valores declarados são, muitas vezes, apenas
estimativas feitas pelas empresas, pois algumas concessionárias não sabem a
quantidade exata da sua produção. Sem medidores que determinem valores exatos,
a perda pode ser bem maior que o declarado.
“Muitos valores são omitidos. Eles não sabem o
quanto perdem de água, porque cerca de 90% das companhias não têm medidores na
entrada e saída da estação, então estimam o volume produzido. E muitos mentem
para conseguir financiamentos”, afirma o presidente do Sindicato Nacional das
Concessionárias Privadas de Serviços Públicos de Água e Esgoto (Sindcon),
Giuliano Dragone.
As perdas ocorrem devido a vazamentos na rede e
transbordamento de reservatórios, ocasionados por falta de manutenção e de
investimentos nos sistemas, além da má gestão, aponta Wilson de Figueiredo
Jardim, da Unicamp.
Grande parte dessa perda poderia ser estancada com
investimentos em renovação das redes e equipamentos de controle. “O setor
privado sabe que a perda é sinônimo de ineficiência. As empresas privadas
investem muito em automação e em setorização da rede”, alega o presidente do
Sindcon. O setor privado atende a 10% da população brasileira, 70% dos
consumidores pagam a companhias estaduais pelo fornecimento de água e 20% a
órgãos municipais.
Dragone cita os exemplos das cidades de Limeira e
Palestina, no interior de São Paulo, onde em poucos anos houve grandes avanços
na redução desse volume. “Em 1995, Limeira tinha perdas na ordem de 45% e
quatro anos após a concessão esse valor caiu para 17%. Em Palestina era de
quase 50% e, em três anos, conseguiu-se reduzir para 15%”, conta.
Bolso do consumidor
Vazamentos e transbordamento nos reservatórios originam o desperdício
Não são as empresas que arcam com os custos da
perda. O consumidor é quem acaba pagando a conta, pois esse valor está incluso
na tarifa. “Se as operadoras de água não recebessem pelo desperdício,
certamente esse quadro seria muito diferente. Mas elas estão numa posição
extremamente cômoda porque perdem água e recebem por ela”, afirma Jardim.
Na opinião do pesquisador, para mudar esse cenário
os governos deveriam fixar metas realistas de redução e buscar o
comprometimento das prestadoras de serviço com esse objetivo, além de reforçar
a fiscalização. No modelo atual, não existe um órgão federal para fiscalizar as
perdas – o serviço é feito por agências reguladoras estaduais e municipais.
Mesmo que as empresas cortem o desperdício de água,
especialistas não acreditam que a economia seja revertida ao consumidor. “A
redução da perda permite sanar problemas de caixas das empresas. A empresa vai conseguir
ter uma boa gestão, economizar com a redução e sobrará dinheiro para investir.
Reduzir tarifa é complicado, mas melhorar o serviço para a população é
possível”, afirma Dragone.
Para reduzir o desperdício, Osvaldo Garcia, do
Ministério das Cidades, não acredita que uma fiscalização mais intensa seja a
melhor saída. “Tem que haver investimento por parte da concessionária. Ele tem
que investir pra diminuir essa perda”, sugere.
Fonte: Agência Deutsche Welle
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