Projeto que libera tecnologia
Terminator, que pode tornar sementes estéreis, avança na Câmara.
Poucos brasileiros sabem, mas as discussões estão
avançadas na Câmara dos Deputados que seja aprovado projeto que libera uma
tecnologia genética polêmica a tecnologia de restrição de uso, que, entre
outras aplicações, pode ser usada para criar sementes estéreis a partir da
segunda geração, popularmente apelidadas de sementes
terminator.
O Projeto de Lei (PL) 268/2007, do deputado
Eduardo Sciarra (PSD-PR), abre uma brecha na redação da Lei de Biossegurança
para que seja permitida a comercialização de sementes produzidas com a
tecnologia, no caso de plantas biorreatoras, usadas para produzir substâncias
de uso industrial ou terapêutico.
A proposta já passou pelas comissões de
Agricultura e Meio Ambiente, sendo aprovada na primeira e rejeitada na segunda.
Atualmente, está na Comissão de Constituição e Justiça, (CCJ) onde recebeu
parecer favorável do relator e quase foi votada em outubro do ano passado. A
votação não ocorreu porque organizações da sociedade civil e movimentos sociais
entregaram à presidência da CCJ um abaixo-assinado com 30 mil assinaturas
pedindo a retirada de pauta do projeto.
No site da Câmara dos Deputados, a última
movimentação relativa à proposta é um requerimento de audiência pública sobre o
assunto, feito pelo deputado Alessandro Molon (PT-RJ), no início de dezembro.
Até o momento, nenhum organismo do tipo foi desenvolvido
em campo aberto, embora acredite-se que as empresas façam pesquisas em
ambientes controlados. Uma moratória internacional, apoiada pelo Brasil, barra
a produção em campo e a comercialização desde 2000. Um dos riscos da liberação
é a contaminação das espécies não modificadas geneticamente pelas lavouras de
transgênicos. A engenheira agrônoma Maria José Guazelli, da organização não
governamental (ONG) Centro Ecológico, explica que espécies não transgênicas
poderiam assimilar características como a esterilidade.
Para ela, mesmo que a liberação se restrinja às
sementes desenvolvidas para uso terapêutico e industrial, há risco de poluição
genética das espécies alimentícias. “Uma boa parte dessas plantas biorreatoras
são arroz, milho. Dependendo de que planta for, pode haver cruzamento, sim”,
afirma.
Para Maria José, as normas de contenção que têm
sido aplicadas no Brasil não são suficientes para mitigar os riscos.
“Geralmente, a CTNBio [Comissão Técnica Nacional de Biossegurança] determina
distância [entre a lavoura transgênica e não transgênica]. Mas o pólen voa
centenas de metros e até quilômetros. O que tem acontecido é a contaminação”,
disse a agrônoma, citando casos em que agricultores orgânicos constataram
contágio por soja e milho transgênicos.
A Agência Brasil entrou em contato com a
assessoria de comunicação do deputado Eduardo Sciarra, pedindo uma entrevista
com o parlamentar, mas foi informada de que ele está fora de Brasília e não
poderia falar naquele momento. No entanto, a assessoria encaminhou à reportagem
material sobre o PL 268/2007.
Sobre a questão da possível contaminação de
espécies não modificadas geneticamente, o texto afirma que “pode-se construir
plantas [biorreatoras] que não se reproduzem pelo polén”. Segundo o material
enviado pelos assessores do deputado, “a tecnologia genética de restrição de
uso não se resume à modalidade conhecida como terminator. Pode haver diversos
tipos de construção dessa tecnologia. Em um deles, elimina-se a floração,
retardando a data de maturidade sexual da planta e construindo plantas com
pólen estéril”.
No entanto, para o agrônomo e assessor técnico da
organização da sociedade civil AS-PTA Agricultura Familiar e Agroecologia
Gabriel Fernandes, ainda há muitas incertezas em relação à tecnologia de
restrição de uso e, portanto, não há garantia da eficácia das soluções
apontadas .“Primeiro, o projeto de lei não está prevendo regras de segurança.
Outra coisa que pode ser questionada é se essas regras funcionam. Não tem nada
que garanta [que a esterilidade do pólen] funcione 100%.”
Para Fernandes, trata-se de uma tecnologia que
não é necessária. Os estudos não dão segurança, e há uma moratória
internacional. “Nenhum país faz experimentos a campo”, argumenta. Na visão do
agrônomo, vantagens apontadas com a adoção da tecnologia de restrição de uso,
como manipulação da floração e de outras fases do ciclo reprodutivo das
plantas, não compensam o risco assumido e parte delas poderia ser obtida com
outras técnicas de manejo.
O pesquisador Francisco Aragão, responsável pelo
laboratório do Centro Nacional de Pesquisa de Recursos Genéticos e
Biotecnologia, da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), tem
opinião diferente. Para ele, é possível conter os riscos de contaminação e,
além disso, a tecnologia de restrição de uso abre várias possibilidades. Aragão
exemplifica com a cana-de-açúcar, que gasta na floração uma energia que,
segundo ele, poderia ser aplicada na produção de mais açúcar. A restrição de
uso poderia impedir a floração e tornar o processo mais eficiente, afirma.
“Pretende-se fazer o cultivo dessas plantas, a
princípio em ambientes fechados. Há possibilidade de escape, mas existe todo um
mecanismo de segurança. Já tem pesquisa para produção de fármacos em plantas e
a restrição de uso colocaria um mecanismo de segurança a mais no sistema [em
razão da esterilidade]”, explicou o pesquisador. Para ele, deve ser mantida a
proibição para a agricultura e haver permissão para alguns casos, como a
produção de fármacos e a obtenção de características agronômicas, que “nada têm
a ver com a retirada do direito do produtor de reutilizar sementes”.
Fonte: Agência Brasil
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