Lixões e Áreas Degradadas:
Maioria das Prefeituras não pretende cumprir a legislação em 2014, artigo de
Antonio Silvio Hendges
A
Política Nacional de Resíduos Sólidos – PNRS (Lei 12.305/2010 e Decreto
7.404/2010) é o resultado de um debate de 19 anos na sociedade, principalmente
ambientalistas, trabalhadores com materiais recicláveis/reutilizáveis –
catadores e no Congresso Nacional. Sua aprovação constituiu uma boa perspectiva
para diversas áreas e atividades relacionadas com a gestão, planejamento, desenvolvimento
econômico, novas tecnologias, inclusão social, erradicação dos lixões e
recuperação de áreas degradadas, responsabilidade compartilhada pelo ciclo de
vida dos produtos e a logística reversa de produtos desgastados e/ou obsoletos.
O
estabelecimento de prazos e metas para a adequação dos municípios também trouxe
a possibilidade de uma melhoria significativa na qualidade de vida com uma
cronologia das ações bem definida, relacionando os resíduos com outras
atividades de saneamento básico, como o abastecimento de água, esgotamento
sanitário e a drenagem das águas das chuvas (Lei 11.445/2007).
Entre
os prazos definidos pela PNRS, a elaboração dos planos municipais de gestão
integrada dos resíduos sólidos – PMGIRS deveria ser realizada até agosto/2012,
inclusive com audiências públicas para sua avaliação e aprovação nas câmaras de
vereadores respectivas. Os planos municipais são um documento legal, uma lei
municipal com os diagnósticos e prognósticos da situação dos resíduos com
caracterização, metas, procedimentos operacionais, definição de
responsabilidades, capacitação técnica, educação ambiental, inclusão social e
geração de renda, fiscalização, custos e locais para a destinação final
adequada, entre outros itens previstos para a organização dos serviços públicos
de limpeza urbana.
Mas
até a data estabelecida, somente 314 municípios – 9% tinham concluído seus
planos e 1449 municípios – 42% estavam em fases diversas da elaboração. Estes
dados são da Confederação Nacional dos Municípios – CNM divulgados em 03 de
agosto de 2012. Para o Ministério do Meio Ambiente, 488 municípios haviam
solicitado e recebido recursos federais para investirem na elaboração e
execução dos PMGIRS.
Outro
prazo definido pela PNRS é para a erradicação dos lixões que deve ser realizada
até agosto/2014. Segundo o Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas – Ipea
são 2906 lixões em 2810 municípios brasileiros. Certamente, devem existir
outras áreas não catalogadas e/ou clandestinas em que são depositados resíduos
diversos como sobras de construções e demolições, embalagens,
eletroeletrônicos, medicamentos e resíduos de saúde e outras sobras da produção
e consumo. Está prevista a recuperação destas e outras áreas degradadas e a
organização de cooperativas e associações de catadores para a implantação de
programas de coleta seletiva, destinando-se somente os rejeitos para aterros
sanitários adequados.
Mas
a inexistência dos planos municipais de resíduos na maioria dos municípios,
poucos programas eficientes de coleta seletiva, reciclagem e reutilização
restritos as cidades maiores, dificuldades técnicas, econômicas e políticas
locais e regionais são obstáculos já anunciados pelas administrações municipais
para a erradicação dos atuais lixões e sua substituição por aterros sanitários
em 2014. Em relação à coleta seletiva, são 32,3% dos municípios brasileiros que
declaram ter programas, mas possivelmente a abrangência, a eficácia e a
eficiência destes programas em sua maioria estão aquém das possibilidades desta
atividade. Quanto às cooperativas e associações de catadores, em somente 14,8%
dos municípios existe parceria formal entre as administrações e estas entidades
para a coleta seletiva.
Entre
as dificuldades técnicas, a inexistência nos quadros de funcionários dos
municípios de profissionais capacitados – engenheiros ambientais, biólogos,
sociólogos e outros necessários para a formação de equipes multidisciplinares –
para a realização dos planos de resíduos e saneamento é um dos principais
obstáculos enfrentados, assim como dificuldades econômicas para a contratação
de equipes ou empresas especializadas. As dificuldades políticas impedem a
formação de consórcios que regionalizem as soluções e ampliem a abrangência dos
serviços, como a construção e licenciamento de aterros sanitários adequados aos
diversos tipos de resíduos identificados. Outra alegação das administrações
municipais é que os prazos para adequação são muito curtos e isto torna
impossível o cumprimento das metas da PNRS.
Mas
algumas considerações são necessárias quanto aos argumentos utilizados pelos
municípios, suas associações e federações. A inexistência de programas de
coleta seletiva para a reciclagem e a reutilização é uma demonstração da falta
de apoio público a estes programas, de capacitação aos catadores individuais ou
suas associações assim como de educação ambiental direcionada aos consumidores
e outros geradores de resíduos com potencial para esta atividade. A ausência de
profissionais adequados nos quadros de funcionários também demonstra a falta de
gestão e controle pelos municípios dos setores relacionados ao saneamento
básico e aos resíduos, sendo os trabalhadores responsáveis pela limpeza pública
de baixa escolaridade e qualificação e os serviços terceirizados em grande
parte das administrações.
As
diferenças políticas regionais que impedem a consorciação certamente têm um
peso significativo e podem ter muitas formas como discordâncias partidárias e
administrativas, interesses de empresas prestadoras de serviços de coleta e
disposição final, características específicas dos municípios e/ou geradores,
configurações da distribuição regional do poder com a formação de grupos
administrativos/políticos/econômicos privilegiados e outras características
específicas de cada local do país.
A
alegação de que os prazos são restritos demonstra falta de informação e de
interesse da maioria dos administradores em acompanhar matérias importantes. A
Política Nacional de Resíduos Sólidos tramitou em todas as Comissões do
Congresso desde o Projeto de Lei 203/1991 e foi aprovada na Câmara e Senado
após dezenove anos em 2010, a realização dos planos foram previstos para dois
anos até agosto/2012 e a sua implantação em mais dois anos com a erradicação
dos lixões em agosto2014. Portanto, são vinte e três anos difíceis de serem
ignorados por quem pretende administrar – e bem – as suas cidades,
principalmente com conceitos inovadores e responsabilidade com a qualidade de
vida dos munícipes.
Entre
os bons exemplos que demonstram ser possível o cumprimento dos prazos
estabelecidos pela PNRS e a responsabilidade das administrações com a gestão
dos resíduos está o Consórcio Pró-Sinos (www.consorcioprosinos.com.br) no Rio Grande do Sul. Formado por
26 municípios do Vale do Rio dos Sinos, com diversidade de atividades
econômicas, extensões territoriais e densidade populacional, os planos de
gerenciamento foram entregues no dia 28 de agosto de 2012:
(http://www.ecodebate.com.br/2012/09/04/consorcio-publico-de-saneamento-pro-sinos-rs-planos-de-residuos-solidos-estao-prontos-artigo-de-antonio-silvio-hendges/) e há um trabalho intenso de ações,
capacitação dos municípios e de educação ambiental para a população. O plano
regional e os planos de resíduos de todos os municípios participantes do
Consórcio Pró-Sinos está disponível em PDF no link:
Referências:
-
Pesquisa aponta que apenas 9% dos municípios fizeram plano de gestão de
resíduos. Disponível em:
http://www.em.com.br/app/noticia/especiais/rio-mais-20/noticias/2012/08/03/noticias_internas_rio_mais_20,309859/pesquisa-aponta-que-apenas-9-dos-municipios-fizeram-plano-de-gestao-de-residuos.shtml Acesso em: 06/01/2014.
-
Ipea: Brasil ainda possui 2.906 lixões que precisam ser erradicados até 2014.
Disponível em:
http://www.ecodesenvolvimento.org/posts/2012/abril/ipea-brasil-ainda-possui-2.906-lixoes-que-precisam Acesso em: 06/01/2014.
-
32,3% dos municípios brasileiros têm coleta seletiva de lixo, diz IBGE.
Disponível em:
http://g1.globo.com/brasil/noticia/2012/11/323-dos-municipios-brasileiros-tem-coleta-seletiva-de-lixo-diz-ibge.html Acesso em: 06/01/2014.
-
Consórcio Público de Saneamento Pró-Sinos, RS: Planos de Resíduos Sólidos estão
prontos. Antonio Silvio Hendges. Disponível em:
http://www.ecodebate.com.br/2012/09/04/consorcio-publico-de-saneamento-pro-sinos-rs-planos-de-residuos-solidos-estao-prontos-artigo-de-antonio-silvio-hendges/. Aceso em11/01/2014.
Antonio
Silvio Hendges, Articulista do Portal EcoDebate, é Professor de biologia,
assessoria em resíduos sólidos, educação ambiental e sustentabilidade
empresarial (www.cenatecbrasil.blogspot.com.br). Email: as.hendges@gmail.com
Fonte: EcoDebate
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