Fragmentação florestal afeta
biodiversidade de aves
Resultados da pesquisa coordenada por
Mauro Galetti, da Unesp de Rio Claro, foram apresentados na FAPESP Week North
Carolina e publicados na revista Science (foto do Selenidera maculirostris:
Wikipedia)
Processos de deflorestação são conhecidos como
obstáculos para a manutenção dos ecossistemas em florestas, mas suas
consequências, distintas para espécies da flora e da fauna, podem ser ainda
piores para determinados grupos de animais. É o que indica uma pesquisa
liderada pelo professor Mauro Galetti, do Departamento de Ecologia da
Universidade Estadual Paulista (Unesp), campus de Rio Claro.
Segundo a pesquisa, é este o caso das aves, cuja
diversidade de espécies é ameaçada não apenas em circunstâncias de desmatamento
de grandes áreas verdes para, por exemplo, a produção agroindustrial, mas
também quando as matas são preservadas de forma não contínua e tecnicamente sem
proximidade. Ou, ainda, quando não há conservação de áreas suficientemente
densas para sua sobrevivência e reprodução.
Dados que relacionam a diminuição das matas à
sobrevivência de diferentes espécies de aves – e a diminuição de aves como
fator de declínio na taxa de dispersão de sementes – , parte de um projeto de
pesquisa mais abrangente sobre a maneira como a fragmentação das florestas
afeta essa biodiversidade, foram apresentados por Galetti no dia 12 de novembro
durante a FAPESP Week na Carolina do Norte, em Raleigh,
Estados Unidos.
O simpósio internacional – organizado pela FAPESP,
pela University of North Carolina em Chapel Hill, pela University of North
Carolina-Charlotte, pela North Carolina State University (NCSU) e pelo Brazil
Institute do Woodrow Wilson International Center for Scholars, de Washington –
reuniu pesquisadores dos dois países com o objetivo de intensificar o
intercâmbio e ampliar as pesquisas conjuntas realizadas nos Estados de São
Paulo e da Carolina do Norte.
Os dados da pesquisa, que também foram publicados
na revista Science, fazem
parte do Projeto Temático “Efeitos de um gradiente de defaunação
na herbivoria, predação e dispersão de sementes: uma perspectiva na Mata
Atlântica”, apoiado pela FAPESP e concluído em março no
Instituto de Biociências da Unesp de Rio Claro.
Galetti e sua equipe se concentraram na
investigação do comportamento de determinadas espécies de aves e de sua
capacidade de evolução em ambientes que sofrem intensa ação humana, como nos
remanescentes da Mata Atlântica na região Sudeste do Brasil.
O professor da Unesp também destacou a redução de
um tipo específico de palmeira, a Euterpe edulis, em decorrência direta
da exploração humana, reunindo informações presentes no artigo publicado na Science.
O trabalho contou com a participação de 15 pesquisadores de oito instituições
de São Paulo, Paraná, Pará, Rio de Janeiro, Goiás e também do México e da
Espanha.
A palmeira descrita na palestra de Galetti é uma
espécie dominante na região da Mata Atlântica e seus frutos são consumidos por
mais de 58 espécies de aves. Essa palmeira, porém, também fornece o
palmito, o que a coloca em risco por causa da ação humana.
Ao verificar as consequências evolutivas do
processo de diminuição de espécies animais como resultado dessa ação, a pesquisa
obteve dados sobre o processo de defaunação que ocorre nesse bioma, buscando
identificar a perda ou o declínio da população de vertebrados nativos de médio
e grande portes.
A defaunação representa uma ameaça
significativa não apenas para a Mata Atlântica, mas também para a
biodiversidade dos diversos ecossistemas tropicais.
“Buscamos verificar como essa perda de espécies, em
diferentes níveis, afeta sistemas biológicos ao longo de diferentes processos,
da fisiologia e reprodutibilidade vegetal ao comportamento animal, incluindo
padrões de migração, abrigo e dieta alimentar”, disse Galetti.
Determinadas mudanças nesses padrões podem levar a
interrupções no funcionamento dos ecossistemas e, consequentemente, à
degradação ambiental em prazos curtos ou médios. “No longo prazo, porém, as
alterações podem significar alterações fenotípicas e até na estrutura genética
de populações animais”, disse.
Para Galetti, os dados levantados pelo estudo
indicam que é preciso identificar necessidades e apontar possíveis prognósticos,
para haver tempo de adaptação a uma condição em que haja possivelmente menos
espécies.
Composta em grande medida por espécies herbívoras e
frugívoras, a fauna de médio e de grande porte tem animais importantes para a
dispersão de sementes, que atuam no controle de plantas por meio da herbivoria
e da predação de sementes.
Segundo Galetti, a caça ilegal tem reduzido
consideravelmente a diversidade desses animais em distintas áreas nos
trópicos, especialmente na Mata Atlântica, o que pode ter profundos efeitos na
diversidade e na composição das espécies vegetais.
Com apenas 12% de floresta remanescente, a Mata
Atlântica ainda possui até 8% das espécies de aves do mundo e altas
taxas de endemismo.
Espécies relacionadas
Grandes migrações entre as populações de aves
sugerem que a Euterpe edulis compartilha uma história evolutiva comum
com essas aves, que são importantes agentes para a germinação dessa espécie de
palmeira.
“Suas sementes são espalhadas por ação de
regurgitação e defecação. Contudo, as evidências apontam para uma diminuição de
espécies de aves com capacidade de colher grandes sementes, como tucanos, o que
torna vulnerável a dispersão de sementes maiores, entre elas a da E. edulis”,
disse Galetti.
Segundo os pesquisadores, a diferença entre as
características de tamanho de sementes ocorre em razão de recentes mudanças
causadas pelo crescente isolamento das florestas, cada vez mais
fragmentadas.
O tamanho da semente estaria relacionado à
perda de água e de germinação. Quanto maior a semente, menor a área de
superfície exposta em proporção ao volume. Isso agravaria o problema, visto que
as sementes não germinam com menos de 20% de sua superfície exposta à água.
“A defaunação cria um novo regime de seleção para a
evolução de plantas no antropoceno. Essas mudanças podem até passar
despercebidas, mas são capazes de levar várias espécies à extinção em cenários
climáticos futuros”, disse Galetti.
A pesquisa foi apresentada no painel sobre
biodiversidade, que contou também com apresentações dos pesquisadores Maritta
Koch-Weser, do Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo
(USP), Erin Sills, da North Carolina State University, e Daniel Janies, da
University of North Carolina-Charlotte.
Brazilian Nature
Ainda sobre o tema biodiversidade, a FAPESP Week
North Carolina contou com a exibição da exposição Brazilian Nature –
Mystery and Destiny em dois locais distintos.
A primeira delas foi aberta na James B. Hunter
Library, no Institute of Emerging Issues da NCSU, em Raleigh, onde ficará exposta
no saguão principal até o dia 20 de novembro. A segunda mostra foi aberta no
dia 13 de novembro, na Student Union da University of North Carolina-Charlotte.
Com 37 painéis, a exposição retrata o trabalho do
naturalista alemão Carl Friedrich Philipp von Martius (1794-1868) e permite
comparar as imagens originais feitas no século 19 com fotografias atuais de
plantas e biomas, entre elas algumas feitas durante pesquisas realizadas no
âmbito do projeto Flora Fanerogâmica do Estado de São Paulo e do Programa de
Pesquisas em Caracterização, Conservação, Recuperação e Uso Sustentável da
Biodiversidade do Estado de São Paulo (BIOTA-FAPESP). Os painéis digitalizados
da exposição podem ser vistos com legendas em português, inglês, espanhol,
japonês e alemão no endereço:
Matéria de Samuel Antenor, da Agência FAPESP
Fonte: EcoDebate
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