quinta-feira, 5 de dezembro de 2013

Copa do Mundo 2014, Ilegítima: elitista, privatista e anti-popular
Foto em A Pública, Agência de Reportagem e Jornalismo Investigativo

A análise da Conjuntura da Semana é uma (re)leitura das Notícias do Dia publicadas diariamente no sítio do IHU. A análise é elaborada, em fina sintonia com o Instituto Humanitas Unisinos IHU, pelos colegas do Centro de Pesquisa e Apoio aos Trabalhadores – CEPAT com sede em Curitiba-PR e por Cesar Sanson, professor na Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN.

Sumário:
Uma copa anti-popular
Comitês Populares da Copa: Resistência e potência
Lei Geral da Copa – Cavalo de Tróia
FIFA. Uma grande multinacional despótica
Remoções arbitrárias e o legado oculto
Cidades privatizadas. Sociedade submetida à lógica do capital
Elitização e privatização do futebol

Eis a análise. 


Uma copa anti-popular

Não é exagero afirmar que a realização da Copa do Mundo no Brasil encontra-se ameaçada. Uma pergunta persegue e preocupa o governo, a FIFA e os organizadores do evento: Como serão as manifestações durante Copa do Mundo? Já não há dúvidas de que haverá manifestações durante o Mundial. A dúvida é o tamanho das mesmas, o receio da necessidade de colocar o exército nas ruas, o uso desmedido da ‘mão pesada’ do Estado que pode arruinar a imagem do país lá fora, já agravada pós-Copa das Confederações.

Seis anos atrás quando o Brasil foi escolhido para sediar a Copa do Mundo de 2014, certo ufanismo tomou conta do país. Já faz tempo, porém, que a Copa deixou de ser uma unanimidade e se torna cada vez menos na medida em que se toma conhecimento dos desmandos que a envolvem.

Nesses dias, o acidente com um guindaste na Arena Corinthians e a morte de dois operários maculou ainda mais a realização da Copa do Mundo no Brasil. Às mortes de trabalhadores somam-se uma série de outros problemas: greves, atrasos, remoções, abandono de projetos de mobilidade, gastos exorbitantes, falta de transparência, imposições da FIFA etc.

O sinal de que as coisas não iam bem com a Copa foi dado em junho de 2013 com as grandes manifestações. As multidões sitiaram as arenas de futebol e manifestaram indignação com a exorbitância de gastos, com a falta de transparência, com as imposições da FIFA. As ruas disseram que entre investimentos em estádios e em saúde e educação, ficam com a segunda opção.

Aos poucos foi crescendo a percepção na sociedade de que a Copa não passa de um grande negócio. Um negócio que subordina o Estado brasileiro – a ingerência da FIFA; um negócio que privatiza espaços públicos, que elitiza os estádios, que expulsa milhares de seus locais de moradia, que utiliza dinheiro que falta em áreas mais necessárias.

As manifestações voltarão às ruas por ocasião da Copa do Mundo, ainda mais com os holofotes do mundo todo voltados ao Brasil. Há quem inclusive considere possível até inviabilizar a realização da Copa como o ativista Rodrigo Brizola para quem “não vai ter copa”. Diz ele: “Depende de nós. Vamos resistir, vamos desobedecer. Pra essa Copa já começou a resistência, a palavra de ordem é essa: não vai ter Copa. Se a massa levantar de novo… temos que saber se os movimentos organizados estão com condições de dialogar com essa massa. Se conseguirmos dialogar com a massa, não vai ter Copa”.

Independente do que venha acontecer, quebrou-se o mito do “país do futebol”, o mito de que a Copa do Mundo é sagrada. As ruas mandaram o recado “da Copa eu abro mão, quero mais dinheiro para saúde e educação”.

Quem primeiro levantou a série de equívocos envolvendo a organização do evento foram os Comitês Populares da Copa. Na raiz dos cartazes de rua criticando o ‘modelo da Copa’ estão os Comitês Populares que denunciaram a Lei Geral da Copa, as remoções, os gastos absurdos, as imposições da FIFA.

Comitês Populares da Copa: Resistência e potência

Os Comitês Populares da Copa foram o embrião daquilo que depois se viu nas ruas. Foram eles que alertaram para os desmandos na organização do evento. Chamaram a atenção para a ingerência de fora para dentro com a Lei Geral da Copa, as violações de direitos, as remoções indevidas, o uso exorbitante e sem consulta popular do dinheiro público, entre outros.

Em todas as cidades que sediarão os jogos da Copa do Mundo – Belo Horizonte, Brasília, Cuiabá, Curitiba, Fortaleza, Manaus, Natal, Porto Alegre, Recife, Rio de Janeiro, Salvador e São Paulo – foram formados Comitês Populares da Copa.

Em junho desse ano, alguns dias antes de explodirem as manifestações de rua, a revista IHU On-Line produziu um número exclusivo sobre a Copa do Mundo. A revista intitulada Copa do Mundo. Para quem e para quê? entrevistou vários estudiosos e integrantes dos Comitês Populares da Copa.

Uma leitura atenta da revista permite a compreensão do que se viu dias depois nas ruas de todo o Brasil. A tarefa dos Comitês, na opinião da arquiteta e urbanista Claudia Favaro, integrante do Comitê Popular de Porto Alegre e entrevistada pela IHU On-Line tem sido a de “monitorar os gastos e ser um agente mobilizador da sociedade para garantir que os direitos humanos não sejam violados”, uma vez que todos os megaeventos trazem “impactos muito característicos que ocorrem em função dessas violações pela necessidade de reestruturação urbana”. Assim, “a proposta do comitê é articular os atingidos, monitorar as violações e dar voz aos mais variados setores, principalmente os mais vulneráveis”. Os Comitês gestaram o início da resistência aos equívocos na organização do Mundial.

Na opinião de Julia Ávila Franzoni, integrante do Comitê de Curitiba, assessora da Organização Terra de Direitos e também entrevistada pela revista IHU On Line, a principal contribuição dos Comitês foi o da “produção de um contradiscurso que discute os megaeventos nos marcos do seu modelo de desenvolvimento violador dos direitos humanos”.

Na origem dos Comitês Populares da Copa e durante sua articulação foi lançado, em 2011 um Dossiê intitulado ‘Megaeventos e Violações de Direitos Humanos no Brasil’. O dossiê foi entregue aos governos e prefeituras das doze cidades-sede da Copa, e para outros órgãos municipais, estaduais, federais e internacionais. Nele estão presentes as denúncias que irão aflorar posteriormente nas manifestações:

- Moradia: despejos arbitrários e remoções inteiras em processos ilegais de desapropriação para as obras da Copa;
- Trabalho: as greves e paralisações são resultados de baixos salários, más-condições de trabalho e superexploração da mão de obra em função de atrasos e cronogramas apertados;
- Acesso à Informação, Participação e Representação Popular: criação de instâncias paralelas de poder, que estão isentas de qualquer controle social;
- Meio ambiente: facilitação de licitações ambientes para obras;
- Mobilidade: expulsão das famílias mais pobres das áreas centrais e valorizadas e investimentos em transporte e mobilidade urbana sem considerar prioritariamente as demandas da população;
- Acesso a Serviços e Bens Públicos: diante da resistência dos moradores, prefeituras cortam serviços públicos de comunidades em processo de remoção;
- Segurança Pública: perspectiva de militarização das cidades durante os megaeventos;
- Elitização, ‘Europeização’ e Privatização do Futebol: fim dos setores populares nos estádios e aumento dos preços dos ingressos;

Lei Geral da Copa – Cavalo de Tróia

Dentre as várias denúncias na preparação da Copa do Mundo, os Comitês destacaram o caráter autoritário, abusivo e de ingerência inscritos na Lei Geral da Copa. Uma legislação imposta de fora para dentro a partir dos interesses da FIFA – um verdadeiro ataque à soberania do país, segundo os Comitês Populares da Copa.

A Lei Geral da Copa altera “sumariamente a legislação brasileira, normas amplamente debatidas e, em muitos casos, fruto histórico de pressão e reivindicações dos movimentos sociais para atender a exigências de organismos internacionais como a FIFA e o Comitê Olímpico Internacional – COI” destacavam ainda em março do ano passado, Guilherme Varella, do Instituto de Defesa do Consumidor e Thiago Hoshino, da Organização Terra de Direitos em entrevista ao IHU.

Segundo eles, a FIFA e o COI “são verdadeiras empresas transnacionais, mais preocupadas com o jogo do mercado do que com os jogos esportivos”. De acordo com Guilherme Varella e Thiago Hoshino, a Lei Geral da Copa pode ser considerada “um cavalo de troia que abre perigosos precedentes no ordenamento jurídico brasileiro. Ela não é a primeira medida e tudo indica que não será a última a regulamentar ‘o regime de exceção’ para os jogos”.

O advogado Paulo Lemos, presidente do Colégio de Ouvidorias das Defensorias Públicas do Brasil e entrevistado pela revista IHU On-Line considera estranho ver o Brasil fiel aos ditames da FIFA, uma vez que ela “só tem dado ordens, enquanto o pagamento da fatura tem sido feito, cem por cento, com o dinheiro do contribuinte brasileiro, que não poderá assistir aos jogos da copa, presencialmente”.

Diante da abusiva ingerência da FIFA, exigindo, determinando, cobrando, alterando a legislação brasileira, não é surpresa que a mesma tenha se tornado um dos alvos preferidos dos manifestantes.  Dentre os absurdos, um dos que mais gerou indignação está a proibição de vendedores ambulantes comercializar produtos num raio de dois quilômetros dos estádios, ou seja, a FIFA criou um território que é governada por ela e não pelo governo brasileiro.

FIFA. Uma grande multinacional despótica

O presidente da FIFA, Joseph Blatter durante a Copa das Confederações se deu conta da ira dos manifestantes e chegou a fugir do país com medo dos protestos. O jornalista Juca Kfouri conta que “eles [FIFA] ficaram muito assustados, tiveram medo de gente deles morrer, pensaram em suspender a Copa das Confederações”. Segundo ele, “em Salvador, eles tiveram funcionários agredidos, carros depredados”.

Kfouri comenta, “o Blatter foi embora, ele tinha um almoço marcado aquele dia com o Eduardo Campos [governador de Pernambuco] e com o prefeito do Recife e se mandou para a Turquia, pô, que estava pegando fogo, mas ele preferiu a Turquia do que ficar aqui. Aí quando o governo deu a resposta que eles esperavam, com Força Nacional nas ruas e tudo mais, ele veio. Veio e não foi anunciado nem no Mineirão e nem no Maracanã. Passou quase incógnito”. Segundo Juca Kfouri, “a FIFA é uma grande multinacional, que ganha aos tubos, pouco transparente”.

A FIFA arranhou tanto a sua imagem com o seu despotismo no Brasil que é uma das concorrentes ao prêmio de “pior corporação do mundo”. A FIFA “contribui para a violação dos direitos humanos, assim como ao direito à moradia, direito de protestar e de trabalhar”, destaca o site promotor do prêmio Public Eye Awards que desde 2000 elege a “pior corporação do mundo” e o parâmetro para que se alcance tal “honraria” é a “prática de negócios irresponsáveis”. Em 2014, a Fifa, é a favorita para ganhar o “prêmio. A indicação da Fifa foi feita pela Articulação Nacional dos Comitês Populares da Copa.

Remoções arbitrárias e o legado oculto

A realização da Copa do Mundo tem sido perversa para muitas pessoas. Em nome da necessidade de construção das arenas, da reestruturação viária nos seus entorno e até mesmo por higienização e esteticização, milhares estão sendo expulsos do lugar em que vivem há décadas.

De acordo com dados de um mapeamento divulgado pela Articulação Nacional dos Comitês Populares da Copa (Ancop), em parceria com a ONG Conectas, calcula-se que 250 mil famílias correm o risco de serem despejadas por causa das obras em preparativo para a Copa do Mundo.

Falta de transparência, indenizações insuficientes e reassentamentos inadequados para as famílias removidas são marcas de um modelo de gestão empreendedora neoliberal no interior das cidades-sede da Copa.

Na opinião de Orlando Alves dos Santos Junior, pesquisador da Rede Observatório das Metrópoles do Rio de Janeiro em entrevista à IHU On Line há um legado oculto nesse processo das remoções. Segundo ele, “todas estas grandes obras se dão no marco do neoliberalismo, pois existe a subordinação do poder público aos valores do mercado, que promove a privatização e a mercantilização da cidade na perspectiva de atração de investimentos”.

Nisso tudo, diz o pesquisador, “há um legado oculto que não oferece informações ao cidadão sobre o que, de fato, está ocorrendo na sua cidade, ou seja, trata-se de um processo que não conta com mecanismos de participação nas decisões, sendo que tais decisões estão legitimadas pelos eventos da Copa do Mundo e Olimpíadas, como se sediar tais coisas justificasse as opções que estão sendo definidas”. Tudo isto produz uma elitização e mercantilização de certas áreas da cidade, destaca.

Nesse mesmo contexto da mercantilização da cidade, a arquiteta e urbanista Claudia Favaro também entrevista pela IHU On Line, aponta para o fato das populações mais pobres estarem sendo removidas de forma violenta, sem nenhuma alternativa, ocorrendo verdadeiras tentativas de higienização e elitização dos espaços públicos, com a expulsão dos mais pobres de determinadas áreas.

Cidades privatizadas. Sociedade submetida à lógica do capital

Na opinião do urbanista Carlos Vainer, professor do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional (Ippur) da UFRJ, “os megaeventos aparecem como pretexto para a realização de uma série de anseios econômicos, políticos e ideológicos de uma direita conservadora que pretende submeter a sociedade à lógica do grande capital”.

Segundo ele, “para isso é necessário limpar a cidade, retirando os pobres das áreas destinadas a receber investimentos públicos mais expressivos para que os ganhos fundiários resultantes desses investimentos com a valorização imobiliária sejam destinados a quem interessa”.

Para Vainer, as obras de mobilidade urbana incluídas na Matriz de Responsabilidades da Copa refletem isso: “Na maioria das cidades, os investimentos de mobilidade não têm atendido as demandas das camadas populares com transporte público de massa”, opina, exemplificando em seguida: “No Rio de Janeiro, onde 80% da demanda de transporte público de massa está nos subúrbios, na Baixada Fluminense e na grande Niterói, os investimentos estão sendo feitos para áreas em grande parte vazias da Barra da Tijuca e Recreio, onde temos menos de 5% da população da região metropolitana do RJ. Esses investimentos, na verdade, estão é valorizando os grandes latifúndios vazios da Barra da Tijuca e Recreio”, avalia o pesquisador.

Análise semelhante é feita por Paulo Roberto Rodrigues Soares, professor do Departamento de Geografia – UFRGS e membro do Observatório das Metrópoles – Núcleo Porto Alegre. Segundo ele, “entendemos que os pontos críticos do novo modelo urbano são as políticas de mobilidade baseadas no transporte individual, a política habitacional regulada exclusivamente pelo capital privado e a atração de megaeventos como alavanca para projetos desenvolvimentistas. Os três entrelaçados estão produzindo cidades mais privadas, mais fragmentadas, menos solidárias e de pior qualidade de vida. Bem ao contrário do que poderíamos esperar de um efetivo programa de reforma social”.

Gastos exorbitantes que não tem fim

Há outro escândalo que cerca a organização do Mundial. Gastos exorbitantes que não tem fim. Não falta dinheiro para as obras da Copa frente às imensas carências de serviços de saúde, educação, saneamento, entre outros. Esse é um dos fatores que constrange a realização da Copa.

O Brasil já bateu a soma do que a África do Sul e a Alemanha desembolsaram para os dois últimos Mundiais. O valor gasto para reforma ou construção dos 12 estádios chega próximo a 8 bilhões de reais segundo dados  do Sindicato Nacional de Arquitetura e da Engenharia – Sinaenco, que conta com correspondentes nas 12 cidades-sedes e realiza acompanhamento mensal de projetos ligados à competição.

O valor total, entretanto, chegará a R$ 28 bilhões. Além de estádios (R$ 7,5 bilhões), obras de mobilidade urbana (R$ 8,9 bilhões), ampliação de aeroportos (R$ 8,4 bilhões) e portos (R$ 675 milhões), gastos com segurança (R$ 1,9 bilhão), telecomunicações (R$ 371 milhões) e infraestrutura de turismo (R$ 212 milhões). Segundo a Auditoria Cidadã da Dívida, os R$ 28 bilhões que serão gastos com a Copa – evento que vai durar um mês – representam em torno de metade do valor destinado para a Educação no Orçamento Geral da União para todo o ano de 2012, que foi de R$ 57 bilhões, e cerca de 40% do destinado para a Saúde, de R$ 71 bilhões.

Os gastos suntuosos revelam ainda outro caráter perverso, o de que tem muita gente ganhando muito dinheiro com a Copa – particularmente as empreiteiras e os consórcios que irão administrar as arenas. Majoritariamente estão sendo construídas com recursos públicos, mas serão privatizadas em suas administrações.

Um seleto grupo de empreiteiras está à frente das obras da Copa, entre elas, Odebrecht – responsável pela obra do Itaquerão onde morreram os operários –, Camargo Correa, Andrade Gutierrez, Queiroz Galvão, OAS e JBS. Essas mesmas empresas também são generosas doadoras de recursos para campanhas eleitorais destaca João Roberto Lopes Pinto, coordenador do Instituto Mais Democracia.

O dinheiro para a construção das arenas vem do BNDES. Comenta João Roberto Lopes Pinto: “É um financiamento subsidiado, porque o BNDES trabalha com uma taxa de juros de longo prazo e tem um percentual de juros abaixo do mercado e um período longo de carência para começar a pagar. Além disso, é dinheiro público oferecido com condicionalidades muito frágeis. Do ponto de vista social e ambiental, não há ação mais efetiva em termos de contrapartidas que os empreendimentos devem observar. Não é a toa que o Eike Batista falou que o BNDES era uma mãe”, diz.

Aliás, um caso emblemático da farra do dinheiro público com a Copa do Mundo envolve Eike Batista. Segundo coordenador do Instituto Mais Democracia, “o caso do Maracanã é emblemático”. Destaca que “o orçamento final da reforma do estádio superou em quase 70% a previsão inicial, passando de R$ 705 milhões em setembro de 2010 para R$ 1,2 bilhão em julho deste ano. As obras foram tocadas por um consórcio entre a Odebrecht, Andrade Gutierrez e Delta, que abandonou as obras em meio a um escândalo de corrupção. Somados os gastos com a reforma do estádio e do ginásio do Maracanãzinho para os Jogos Panamericanos de 2007, foram gastos R$ 1,5 bilhão em recursos públicos no Maracanã”.

Ainda assim, diz ele, “o governo estadual optou por entregar a administração do Complexo do Maracanã (que além do estádio e do Maracanãzinho, conta ainda com o Parque Aquático Julio Delamare e do Estádio de Atletismo Célio de Barros) para a iniciativa privada, gerando questionamentos do Ministério Público do Rio de Janeiro, que tentou, sem sucesso, impedir a licitação para a concessão do estádio, vencida pelo Consórcio Maracanã S.A, integrado pela Odebrecht, IMX, de Eike Batista, e AEG, que vai administrar o complexo pelos próximos 35 anos”.

Como diz o presidente da Associação Nacional dos Torcedores e Torcedoras Marcos Alvito em entrevista para o IHU, “o Estado paga a conta e a iniciativa privada fica com o lucro”.

Elitização e privatização do futebol

Junto com os exorbitantes gastos nas arenas para cumprira o padrão FIFA vem outra consequência: a elitização do futebol brasileiro.  Cerca de 203 mil pessoas assistiram à final da Copa do Mundo de 1950 no Maracanã, o que representava por volta de 8,5 por cento da população do Rio de Janeiro. As entradas para secções de assentos “geral” e “popular,” de onde pessoas das classes média e trabalhadora assistiram ao jogo, representavam 80 por cento do total de assentos. Boa parte dos espectadores assistiu à partida de pé, num estádio com capacidade para 199 mil pessoas.

Para além da elitização, assiste-se ainda a uma privatização dos espaços públicos. Antes da atual remodelagem muitos estádios eram públicos e agora se tornarão privados. Entre eles, por exemplo, o Maracanã uma “arena multiuso” que albergava, além de eventos desportivos, recitais musicais e espetáculos dos tipos mais diversos. Agora, sobre as arquibancadas foram construídos camarotes com ampla visão do campo, com vidros que separam os espectadores VIP do resto dos espectadores. Contam com bares, televisão e ar condicionado, costumam ser alugados por empresas que convidam sócios e funcionários que têm o privilégio de chegar diretamente de carro por uma rampa sem o mínimo contato com as ‘massas’.

Nas suítes privativas dos estádios reformados com dinheiro público, milionários e empresas pagam 2,3 milhões de dólares por ingresso vendido por associada da FIFA, comenta Andrew Jennings.

Outro exemplo, entre outros, é a arena das Dunas construída em Natal-RN. A arena foi construída sobre os escombros do antigo Machadão – estádio público. Com a destruição do Machadão se destruiu também o Machadinho – ginásio de esportes que abrigava jogos esportivos da rede pública de ensino. Agora o espaço, anteriormente público, se tornou privado e o Estado não tem mais nenhuma ingerência sobre ele. Tampouco os pobres. Os preços dos ingressos se tornaram proibitivos. Somente entram nas arenas privadas quem ganha muito bem.

O claro caráter anti-popular da Copa do Mundo 2014 ficou evidente na interpelação dos cartazes nas ruas:

“Não queremos estádios – Queremos escolas e hospitais”
“Queremos escolas e hospitais no padrão FIFA”
“Quando seu filho ficar doente leve-o ao estádio”
“Quantos hospitais cabem em um estádio de futebol?”
“Quantas escolas valem um maracanã?”
“Enquanto a bola rola, falta saúde e escola"
“Era uma vez o dinheiro do Brasil, veio a FIFA, ele sumiu"
“Copa é prioridade no Brasil?”
“Eu não votei na FIFA”
“Go home Blatter”
“Fora FIFA”


Fonte: EcoDebate

Nenhum comentário:

Postar um comentário