Material cerâmico converte
energia solar em combustível veicular
Reator solar abastecido com óxido de cério
acrescido de zircônio utiliza o calor para produzir hidrogênio ou monóxido de
carbono.
Sossina Haile, do Caltech, desenvolve reator solar
abastecido com óxido de cério acrescido de zircônio, que utiliza o calor para
produzir hidrogênio ou monóxido de carbono (foto: California Institute of
Technology).
Converter energia solar em combustível que
pode ser estocado e disponibilizado para o abastecimento de veículos já é
realidade, pelo menos em laboratório. O experimento, realizado por Sossina
Haile, do California Institute of Technology (Caltech), nos Estados Unidos,
abre uma nova via para a produção sustentável de energia – um dos maiores
desafios da atualidade.
Professora de Ciência dos Materiais e Engenharia
Química no Caltech, Haile apresentou o relato de seu experimento na sessão
inaugural da 6th International Conference on Electroceramics
(6ª Conferência Internacional em Eletrocerâmica), realizada de 9 a 13 de
novembro em João Pessoa, na Paraíba.
Promovido pela Sociedade Brasileira de Pesquisa de
Materiais, com o apoio da FAPESP, do Conselho Nacional de Desenvolvimento
Científico e Tecnológico (CNPq) e da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal
de Nível Superior (Capes), o evento foi coordenado por Reginaldo Muccillo,
pesquisador do Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen), José
Arana Varela, professor titular da Universidade Estadual Paulista (Unesp),
campus de Araraquara, e diretor-presidente do Conselho Técnico-Administrativo
da FAPESP, e José Antônio Eiras, professor associado da Universidade Federal de
São Carlos (UFSCar).
“Para realizar a conversão de energia, utilizamos
um material cerâmico, o óxido de cério (CeO2)”, disse Haile à Agência FAPESP,
nos bastidores da conferência. “Aquecido a altas temperaturas, ele libera
oxigênio (O2), sem perder sua estrutura. Isso é pura termodinâmica: manutenção
do estado de equilíbrio. Resfriado, volta a absorver oxigênio. Se o
resfriamento ocorrer em presença de vapor de água (H2O) ou gás
carbônico (CO2), o oxigênio será retirado das moléculas de uma ou outra dessas
substâncias, e a reoxidação resultará na liberação de hidrogênio (H2), em um caso,
ou de monóxido de carbono (CO), no outro – ambos com grande potencial como
combustíveis.”
Para aquecer o material, Haile e colaboradores
utilizaram um reator que consiste, de forma geral, em uma cavidade termicamente
isolada, cuja tampa, de cristal de quartzo, concentra a radiação solar. O óxido
de cério, formando uma peça única e porosa, reveste internamente a cavidade.
O oxigênio liberado após o aquecimento flui por uma
saída no fundo do recipiente. E os gases (H2O ou CO2), que resfriam
o óxido de cério, entram radialmente na cavidade, atravessando os poros do
material. Pela mesma porta de saída, escapam o hidrogênio ou o monóxido de
carbono, ejetados após a reoxidação [veja a figura abaixo].
“Uma pergunta específica que fizemos foi: como
modificar o material de modo a aumentar a eficiência do processo e operar em
temperaturas mais baixas?”, contou Haile.
A pergunta é muito relevante do ponto de vista
tecnológico, pois a diminuição da temperatura de redução do óxido favorece
bastante a construção do reator. “Verificamos que, agregando zircônio ao óxido
de cério, é possível liberar o oxigênio com temperaturas menores. Em vez de
operar a 1600 ou 1500 graus Celsius, é possível operar a 1450 ou 1350 graus – o
que é muito vantajoso.”
“O zircônio possibilita baixar a temperatura porque
torna a liberação de oxigênio da estrutura mais fácil do ponto de vista
termodinâmico. Por outro lado, a cinética da reoxidação posterior fica mais
lenta”, ponderou a pesquisadora. Foram realizados, então, vários testes, de modo
a chegar à porcentagem ótima de zircônio para favorecer tanto a temperatura
quanto a cinética. “Constatamos que com um acréscimo de zircônio da ordem de
10% a 20% é possível atender a ambas expectativas”, afirmou.
Haile nasceu na Etiópia em 1966. Sua família foi
obrigada a abandonar o país em meados da década de 1970, após o golpe militar
que depôs o imperador Haile Selassie. Ela conta que seu pai, um
historiador, quase foi morto pelos golpistas. Nos Estados Unidos, Haile
fez seus estudos superiores no Massachusetts Institute of Technology (MIT) e na
University of California, Berkeley. Posteriormente, com bolsas das fundações
Humboldt e Fulbright, desenvolveu pesquisa no Max Planck Institut für
Festkörperforschung, de Stuttgart, Alemanha.
Matéria de José Tadeu Arantes, da Agência
FAPESP
Fonte: EcoDebate
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