Elementos da poluição atmosférica modificam o DNA humano e podem levar ao câncer
Aldeídos
mutagênicos, em concentrações elevadas, podem levar ao câncer
Além dos males causados pela poluição atmosférica
já conhecidos cientistas acabam de detectar, pela primeira vez, uma modificação
em DNA humano causada pela presença de dois aldeídos – acetaldeído e
crotonaldeído — encontrados na fumaça do cigarro e nas emissões veiculares
“Esses aldeídos são mutagênicos e, em concentrações elevadas, podem levar ao desenvolvimento
de câncer”, alerta a professora Marisa Helena Gennari de Medeiros, do Instituto
de Química (IQ) da USP, e pesquisadora do Instituto Nacional de Ciência e
Tecnologia (INCT) de Processos Redox em Biomedicina (Redoxoma).
A constatação foi feita em um levantamento,
realizado em 2010, que analisou a urina de 82 pessoas, sendo 47 residentes na
cidade de São Paulo e outros 35 moradores de São João da Boa Vista, município
no interior do estado. Os resultados mostram que a concentração de adutos
— resultado da reação dos aldeídos com o DNA — foi significativamente
maior nos moradores da capital paulista. “São Paulo tem uma
característica incomum, se comparada a outras grandes capitais do mundo”, conta
Marisa Helena. “Além dos poluentes normalmente encontrados em metrópoles
semelhantes, aqui temos uma grande frota que utiliza o etanol”. A pesquisa
excluiu fumantes, alcoólicos, pessoas com problemas de saúde e fazendo uso de
suplementos alimentares e de medicamentos. Nos testes com a urina, os
cientistas utilizaram técnicas ultrassensíveis como a espectrometria de massas.
Reparo do DNA
A pesquisadora explica que é a primeira vez que a
urina foi utilizada como biomarcador para esse tipo de estudo. “É de
conhecimento que a poluição atmosférica é um agente carcinogênico”, ressalta
Marisa. “No entanto, ainda não se tinha um controle específico em relação aos
danos causados no DNA humano e usando a urina como biomarcador”, explica.
A docente descreve que o que é descartado pela
urina é justamente o produto do reparo do DNA. Ao entrar em contato com o
organismo, os aldeídos se ligam à estrutura do DNA, modificando-a. Contudo, as
enzimas que protegem a estrutura realizam um trabalho de “clivagem” (corte) na
modificação promovida pelos aldeídos. “O resultado deste mecanismo é justamente
o que conhecemos como o reparo, que é o que acaba indo para a urina”, explica.
Se o dano causado ao DNA não for reparado pode levar a uma mutação e ao câncer.
Marisa destaca ainda que a vantagem de se utilizar a urina é que trata-se de um
método não invasivo.
Laboratório
do IQ onde foram analisadas as amostras de urina de 47 pessoas. Método não
invasivo permite o monitoramento da exposição da população a aldeídos presentes
na atmosfera
Fator de risco
Na região metropolitana de São Paulo, onde circula
uma frota de cerca de 7.4 milhões de veículos, aldeídos genotóxicos presentes
na atmosfera são um grande fator de risco para a saúde da população.
Por isso, um aspecto importante da possibilidade de
detecção de adutos de DNA na urina é o desenvolvimento de um método não
invasivo que permita o monitoramento da exposição da população a aldeídos
presentes na atmosfera. Esse monitoramento pode fornecer informações para a
formulação de políticas públicas que reduzam os efeitos nocivos da poluição atmosférica.
“Pretendemos ampliar esse estudo, analisando e comparando amostras de urina de
moradores de diferentes bairros na cidade de São Paulo e de diferentes
cidades”, conclui a pesquisadora.
O grupo responsável pelo estudo integra a rede de
pesquisadores dos Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia (INCT), com
apoio do Conselho Conselho Nacional de Pesquisa e Desenvolvimento Científico
(CNPq), Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) com o
Programa Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (CEPID), e do Núcleo de Apoio
à Pesquisa (NAP) da USP.
O artigo Elevated
α-Methyl-γ-hydroxy-1,N2-propano-2′-deoxyguanosine Levels in Urinary Samples
from Individuals Exposed to Urban Air Pollution, de Camila C.M. Garcia,
Florêncio P. Freitas, Angeĺica B. Sanchez, Paolo Di Mascio e pela professora
Marisa pode ser lido por assinantes em http://pubs.acs.org/journal/crtoec.
Foto:Wikimedia
Foto: Marcos Santos/USP Imagens
Foto: Marcos Santos/USP Imagens
Matéria de Antonio Carlos Quinto, da Agência USP de Notícias
Fonte: EcoDebate
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