A geração ‘nem-nem’: juventude
sem perspectiva? Artigo de José Eustáquio Diniz Alves
[EcoDebate] O Brasil passa pelo processo da
transição demográfica, com a consequente mudança na estrutura etária. O número
de crianças e jovens de 0 a 24 anos tem diminuído, tanto em termos absolutos,
quanto em termos relativos. Ao mesmo tempo, tem crescido a parcela da população
em idade de trabalhar, de 25 a 64 anos. Isto quer dizer que há um processo de
redução da razão de dependência, abrindo uma janela de oportunidade demográfica
para o avanço da qualidade de vida e para resolver os problemas sociais mais
candentes da juventude.
Segundo o demógrafo americano Richard Easterlin
“coortes menores tendem a ter melhores oportunidades no mercado de trabalho e
na educação”. Portanto, o Brasil, que vive a fase do bônus demográfico, tem uma
chance única de avançar com a inclusão social de seus adolescentes e jovens.
Porém, existe uma parte dos jovens brasileiros que
nem trabalham e nem estudam. É a chamada geração nem-nem. Quanto maior o número
de jovens fora da população economicamente ativa (PEA) e fora da escola,
menores são os benefícios do bônus demográfico.
Segundo estudo das demógrafas Ana Amélia Camarano e
Solange Kanso, do IPEA, existiam 8,1 milhões de jovens (de 15 a 29 anos) que
estavam fora da escola e do mercado de trabalho em 2000 (16,9% da população
jovem), atingindo 8,8 milhões (17,2%) em 2010.
Segundo as autoras “Esse crescimento foi
diferenciado por sexo. Enquanto o contingente masculino aumentou em 1.107 mil
pessoas, o de mulheres diminuiu em 398 mil. Do total de homens jovens, 11,2%
encontravam-se na condição de não estudar e não trabalhar em 2010. Entre as
mulheres, o percentual foi bem mais elevado, 23,2%, apesar do percentual de
homens ter aumentado e o de mulheres diminuído. Do total de jovens que não
estudavam e não participavam do mercado de trabalho, 67,5% era composto por
mulheres, embora esta participação venha decrescendo desde os anos 1980” (p.
38).
Ainda de acordo com o estudo do IPEA,
aproximadamente dois terços das mulheres que não estudavam e não trabalhavam
eram casadas e 61,2% já tinham filhos em 2010. Portanto, eram mulheres que
dedicavam a maior parte do seu tempo aos afazeres reprodutivos, que não são
contabilizados nas Contas Nacionais.
Muitas dessas mulheres engravidaram por não terem
alternativas de progresso social e por não terem acesso aos métodos de
regulação da fecundidade. Estas mulheres sofrem com o círculo cumulativo da
falta de direitos: no trabalho, na educação e na falta de acesso aos direitos
sexuais e reprodutivos.
O crescimento do número de homens que não estudam e
não trabalham é também preocupante, pois além de ser um desperdício do
potencial humano, em termos macroeconômico, reflete a falta de oportunidade de
trabalho decente, que é um direito humano básico.
O crescimento do número de jovens “nem-nem” entre
2009 e 2012 é um fato não previsto, pois 2009 foi ano de recessão econômica,
mas os anos de 2010 a 2012 apresentaram crescimento do PIB e isto deveria ter
aberto oportunidades para os jovens na escola e no mercado de trabalho. Cerca
de 40% das moças de 15-24 anos e 25% dos moços estavam fora da PEA e da escola,
em 2012, segundo dados da PNAD (percentual bem mais elevado do que o indicado
pelo censo demográfico).
Existem diversas pessoas que dizem que o Brasil,
devido à queda nas taxas de fecundidade, passaria por um processo de “apagão de
mão de obra”. Contudo, estes dados sobre a geração “nem-nem” mostram o quanto o
Brasil está distante de atingir a situação de pleno emprego e de engajar sua
juventude em atividades que sejam engrandecedoras dos indivíduos e de uma nação
justa, prospera e ambientalmente sustentável.
O número absoluto de jovens está diminuindo no
Brasil. Este é o momento para se investir nos direitos da juventude, permitindo
que façam a transição para a vida adulta de maneira tranquila, saudável e
produtiva. O futuro do país depende da inserção social e da boa qualidade de
vida das novas gerações.
Referências:
ALVES, JED. Fecundidade, Cidadania e Políticas de
Proteção Social e Saúde Reprodutiva no Brasil, Seminário Internacional “Saúde,
Adolescência e Juventude: promovendo a equidade e construindo habilidades para
a vida”, Ministério da Saúde e UNFPA, Brasília, 17/11/2013
http://www.unfpa.org.br/Arquivos/apresentacao_eustaquio.pdf
http://www.unfpa.org.br/novo/index.php/657-apresentacoes-feitas-durante-seminario-sobre-saude-e-adolescente-estao-disponiveis-para-download
http://www.unfpa.org.br/novo/index.php/657-apresentacoes-feitas-durante-seminario-sobre-saude-e-adolescente-estao-disponiveis-para-download
ALVES José Eustáquio Diniz & CAVENAGHI, Suzana.
O Programa Bolsa Família e as Taxas de Fecundidade no Brasil. In: Programa
Bolsa Família : uma década de inclusão e cidadania /organizadores: Tereza
Campello, Marcelo Côrtes Neri. – capítulo 14 Brasília : Ipea, pp: 233-2452013.
José Eustáquio Diniz Alves,
Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em demografia e professor titular do
mestrado em Estudos Populacionais e Pesquisas Sociais da Escola Nacional de
Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE; Apresenta seus pontos de vista em caráter
pessoal. E-mail: jed_alves@yahoo.com.br
Fonte: EcoDebate
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