sábado, 30 de novembro de 2013

MPF afirma ser nula decisão que autorizou retomada das obras da Usina de Belo Monte

Ofício enviado ao PGR pede que caso seja levado ao Supremo Tribunal Federal.

A Procuradoria Regional da República da 1ª Região (PRR1), órgão do MPF, enviou na última quinta-feira, 7, ofício ao procurador-geral da República solicitando o ajuizamento de Reclamação no Supremo Tribunal Federal contra decisão do presidente do TRF 1ª Região que autorizou a retomada das obras da Usina de Belo Monte. Segundo o MPF, a decisão do desembargador Mário César Ribeiro é nula.

No ofício, o procurador regional da República Renato Brill afirma que, diante da liminar concedida pelo relator do processo, desembargador Souza Prudente, que ordenou a paralisação das obras, caberia ao Ibama interpor recurso próprio ou eventualmente postular a Suspensão da Execução da Antecipação da Tutela (SLAT) junto ao presidente do STF. Segundo o procurador, a Suprema Corte é o órgão do Poder Judiciário a quem cabe conhecer do recurso futuro (RE), já que a causa de pedir veicula tema constitucional.

O que aconteceu, no entanto, foi um pedido ao próprio presidente do TRF1, desembargador Mário César Ribeiro, que cassou a decisão do relator do processo e permitiu a continuidade do empreendimento. O ofício pede, então, que o PGR avalie a oportunidade de ajuizamento da Reclamação perante o Supremo requerendo a anulação da decisão de Ribeiro, por usurpar a competência que é do próprio STF.

A Reclamação é um processo sobre competência, previsto no artigo 156, do Regimento Interno do STF.

Entenda o caso:

O MPF do Pará ajuizou em 2011 ação civil pública buscando suspender a eficácia da Licença de Instalação e da Autorização de Supressão de Vegetação (ASV), ambas relativas à construção da UHE Belo Monte. De acordo com o pedido do Ministério Público, a Licença de Instalação não deveria ser emitida enquanto as condicionantes previstas na Licença Prévia não fossem integralmente cumpridas. A ação também pretende que o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) não repasse nenhum recurso para Belo Monte enquanto não cumpridas as condicionantes.

O processo foi extinto sem julgamento do mérito pelo juiz de 1ª instância sob a alegação de perda de interesse processual. O argumento do magistrado foi que já haveria outra Licença de Instalação que revogou a que o MPF buscava suspender. Diante dessa sentença, o MPF recorreu ao TRF1 e obteve uma liminar do desembargador Souza Prudente, que ordenou a paralisação das obras.
O Ibama, então, interpôs o pedido de suspensão de segurança ao próprio presidente do TRF1, que decidiu em sentido contrário a Prudente e determinou a retomada dos trabalhos em Belo Monte.

Fonte: Ministério Público Federal na 1ª Região

Fonte: EcoDebate

sexta-feira, 29 de novembro de 2013

Justiça Federal suspende licenciamento da mineradora canadense Belo Sun, no Xingu
Mapa: ISA / Amazonia.org
Atendendo a pedido feito pelo MPF na semana passada, o juiz federal de Altamira obrigou a mineradora a fazer os estudos de impactos sobre os indígenas

A Justiça Federal em Altamira (PA) suspendeu o licenciamento ambiental do projeto Volta Grande de Mineração, que a mineradora canadense Belo Sun pretendia instalar na mesma região onde está sendo construída a hidrelétrica de Belo Monte, no rio Xingu, no Pará. A decisão atende a pedido do Ministério Público Federal (MPF) e obriga a empresa a fazer os estudos de impacto sobre os indígenas da região, que são exigidos por lei e até agora não foram apresentados.

“A condução do licenciamento ambiental sem a necessária e prévia análise do componente indígena demonstra grave violação à legislação ambiental e aos direitos indígenas”, diz a decisão judicial. A liminar determina a suspensão do licenciamento e a anulação, caso seja expedida, de licença prévia à Belo Sun, “condicionando o licenciamento à elaboração do Estudo de Impacto Ambiental e respectivo Relatório de Impacto sobre o Meio Ambiente do Projeto Volta Grande de Mineração contemplando o componente indígena, devendo ainda seguir as orientações contidas no Termo de Referência elaborado pela Fundação Nacional do Índio (Funai)”.

Em caso de descumprimento da decisão, o juiz Sérgio Wolney Guedes determinou multa diária de R$ 20 mil. A Secretaria de Meio Ambiente (Sema) do Pará já se pronunciou favorável a emitir a licença para o empreendimento sem exigir os estudos e chegou a colocar o assunto em votação na reunião do Conselho Estadual do Meio Ambiente (Coema) do último dia 18 de novembro. A representante do Ministério Público do Estado do Pará (MP), Eliane Moreira, pediu vistas do processo e o assunto deveria voltar à pauta no próximo dia 2 de dezembro. Com a decisão judicial, a concessão de qualquer licença para a Belo Sun no Conselho está proibida.

O projeto Volta Grande de mineração foi anunciado pelos empreendedores como o maior do Brasil. O plano é instalar a mina em Senador José Porfírio, a aproximadamente 10 km de distância da barragem de Belo Monte. A empresa Belo Sun, do grupo canadense Forbes&Manhattan, divulgou aos investidores que extrairá, em 12 anos, 50 toneladas de ouro com um faturamento de R$ 550 milhões por ano. Essa semana, após a reunião do Coema, a Belo Sun emitiu um comunicado em seu site informando aos acionistas que já obtivera votos de 11 dos 13 conselheiros.

Para o MPF, conceder licença para mais um empreendimento de grave impacto sem conhecer os impactos aos indígenas é inadmissível, já que as populações da Volta Grande do Xingu são justamente as que sofrerão o pior impacto da usina de Belo Monte, que é o desvio de 80% a 90% da água do Xingu para movimentar as turbinas. É um dano tão severo que o próprio Instituto Brasileiro de Meio Ambiente (Ibama) ao conceder a licença para a hidrelétrica estabeleceu um período de seis anos de testes para saber se a Volta Grande e as populações terão capacidade de sobreviver à construção da barragem e à seca permanente.

O juiz federal Sérgio Wolney Guedes concorda com a necessidade de precaução e afirma em sua decisão que, “em se tratando de direito ambiental, a tutela não se dirige apenas a casos de ocorrência efetiva do dano, pelo contrário, busca-se justamente proteger o meio ambiente da iminência ou probabilidade de dano, evitando-se que ele venha a ocorrer, pois o dano ambiental é, como regra, irreversível”.

Para o MPF, ao ignorar todas as recomendações, advertências e preocupações, ao desconhecer os impactos de Belo Monte e permitir que os estudos indígenas sejam apresentados depois da concessão da licença prévia, a Sema estaria cometendo diversas ilegalidades e impondo “aos indígenas duplamente afetados (por Belo Monte e agora por Belo Sun) o ônus que deveria ser do empreendedor, de arcar com as externalidades negativas do empreendimento”.


Processo nº 0002505-70.2013.4.01.3903


Fonte: Ministério Público Federal no Pará


Fonte: EcoDebate

quinta-feira, 28 de novembro de 2013

COP19: Negociações esbarram em financiamento para reduzir as emissões e na compensação aos países em desenvolvimento

Desabrigados do Vale de Compostela fazem fila para receber ajuda num centro de atendimento do governo na localidade de New Bataan, no sul das Filipinas.REUTERS
A crise econômica internacional começa pouco a pouco a passar, mas ainda assim a disposição dos países em investir na luta contra as mudanças climáticas permanece fraca. Nesta semana, a 19ª Conferência do Clima da ONU – COP 19 -, entrou no chamado “segmento de alto nível”, com a presença dos ministros dos países participantes, mas as negociações permanecem bloqueadas principalmente sobre o financiamento das ações para reduzir as emissões de gases de efeito estufa e de compensação aos países em desenvolvimento, que já sofrem com os efeitos das mudanças climáticas.

Os ministros chegaram à Varsóvia (Polônia) na terça-feira e têm até a sexta, 22 de novembro, para concluir um texto que servirá de base para o acordo sobre as reduções das emissões de gases do efeito estufa em 2015, na conferência em Paris. Os representantes do Brasil são o chanceler Luiz Alberto Figueiredo e a ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira.

Desde o dia 11, quando o evento se iniciou, os diplomatas de mais de 190 países negociam os termos do texto, porém a determinação das responsabilidades dos países desenvolvidos e em desenvolvimento no aquecimento global é um entrave para o avanço. Os emergentes, como o Brasil, defendem que a carga sobre os países ricos seja maior, devido à participação histórica destas nações nas emissões de gases poluentes desde a Revolução Industrial. Porém uma parte dos desenvolvidos não concorda com o princípio chamado de “responsabilidades comuns porém diferenciadas”.

Os negociadores também não conseguem chegar a um consenso sobre uma ajuda de adaptação para os países mais vulneráveis aos efeitos das mudanças climáticas, como é o caso das Filipinas, atingida por um tufão devastador há duas semanas. Os 100 bilhões de dólares prometidos para 2020 na Conferência de Copenhague, em 2009, estão longe de se tornarem concretos. Outra questão delicada é a das “perdas e danos” sofridos por estes países devido ao aquecimento global, independentemente das ações adotadas para se adaptar.

Enquanto isso, algumas questões registram retrocessos. É o caso do comprometimento de redução de emissões pelo Canadá, a Austrália e o Japão. Os três anunciaram que cortarão as metas prometidas anteriormente – o invés de reduzir 25% dos gases até 2020, os japoneses agora estão dispostos a diminuir apenas 3,8%, em relação ao que emitiam em 2005.

Neste contexto, o clima na conferência é de pessimismo. Desde o princípio, Varsóvia era encarada como uma etapa até a Conferência de Paris, em 2015, quando um novo acordo global sobre as reduções das emissões de gases do efeito estufa (GEE) deve ser firmado entre os chefes de Estado e de Governo. O objetivo é limitar o aquecimento climático a 2°C em relação ao período pré-industrial. Até o momento, a trajetória é de 3,6°C, segundo a Agência Internacional de Energia (AIE).

Ontem, em discurso ao plenário da COP em Varsóvia, o secretário-geral da ONU, Ban Ki-Moon, se declarou “muito preocupado” com a resposta da comunidade internacional para conter o aquecimento global, que considera insuficiente. “Estou muito preocupado, pois nossas ações são ainda insuficientes para limitar a alta da temperatura global sob os abaixo dos 2 graus em relação aos níveis pré-industriais”, declarou o secretário-geral. “Os compromissos tomados atualmente pelos diferentes países são simplesmente insuficientes”, destacou.

Matéria da RFI, reproduzida pelo


Fonte: EcoDebate

quarta-feira, 27 de novembro de 2013

Apenas 5% dos consumidores brasileiros podem ser considerados conscientes’. Entrevista com Moacir Darolt

 “Atualmente o estado do Paraná está dominado pela semente transgênica (no caso da soja e do milho). O princípio da precaução não foi observado no caso do Paraná e do Brasil. As consequências, saberemos no futuro próximo”, afirma o pesquisador e agrônomo.
No primeiro momento da chegada dos transgênicos no Brasil, ainda no final da década de 1990, o Paraná se mostrou um estado bastante resistente à entrada dessas sementes, especialmente com a atuação do então governador Roberto Requião. No entanto, com a liberação dos transgênicos no território brasileiro, em 2003, o estado logo se tornou um dos maiores produtores brasileiros em matéria da tecnologia. Para o pesquisador e agrônomo do Instituto Agronômico do Paraná – IAPAR, Moacir Darolt, “a liberação levou em conta apenas a questão produtiva e econômica, passando por cima das questões de saúde e riscos ambientais”. E continua: “O princípio da precaução não foi observado no caso do Paraná e do Brasil. As consequências, saberemos no futuro próximo”.

Uma resposta a este movimento hegemônico são as produções alternativas, orgânicas e agroecológicas. Além disso, há também o movimento do consumo consciente, que busca valorizar produtos desenvolvidos em condições sociais e ambientais adequadas e sem risco à saúde humana. No entanto, ainda que o interesse sobre o tema venha crescendo, Darolt estima que “apenas 5% dos consumidores brasileiros podem ser considerados conscientes”. Há várias dificuldades envolvidas nesse tipo de produção, especialmente na forma como a cadeia produtiva sem rastreabilidade oferece pouca segurança para o consumidor. Ainda assim, em entrevista concedida por e-mail à IHU On-Line, ele ressalta: “É preciso acreditar que a capacidade do consumidor em mudar hábitos de consumo tem reflexos em outros segmentos da economia, construindo mercados locais mais fortes”. E conclui: “Nós somos o reflexo de nosso sistema de produção”.
Moacir Roberto Darolt é graduado em Agronomia pela Universidade Federal do Paraná – UFPR, possui especialização no Institut de l’Elevage, na França, com um trabalho sobre engenharia de projetos e desenvolvimento rural, e doutorado em Meio Ambiente e Desenvolvimento Rural também na UFPR. Atualmente é agrônomo do Instituto Agronômico do Paraná – IAPAR. Darolt é autor de vários livros que abordam a agricultura orgânica e a ecologia, muitos voltados para leigos ou para o público infantil. Destacam-se, entre outros, Alimentos Orgânicos: um guia para o consumidor consciente (Londrina: IAPAR, 2007) e Conexão Ecológica: novas relações entre agricultores e consumidores (Londrina: IAPAR, 2012).

Confira a entrevista

IHU On-Line – Em 2013, completam-se dez anos da entrada das sementes transgênicas no Brasil. Neste primeiro momento o Paraná foi um Estado que resistiu bastante à entrada deste tipo de cultivo. Por que isso aconteceu?

Moacir Darolt – O tema causou muita polêmica entre o final dos anos 1990 e início do novo século no Paraná e continua sendo alvo de discussões acaloradas, sobretudo por parte de entidades da sociedade civil organizada que rejeitam os transgênicos. Na época houve uma posição contrária do governador do Paraná, Roberto Requião, que através da Secretaria da Agricultura e Abastecimento montou um esquema de fiscalização para barrar a comercialização de sementes transgênicas no Estado, que vinham sendo contrabandeadas da Argentina desde o fim dos anos 90. Os plantios clandestinos (não autorizados) levaram à interdição das lavouras e dos produtos pelos órgãos de defesa vegetal a partir de 2001.

As lavouras transgênicas no Sul do Brasil no período foram implantadas com material desconhecido, grãos não adaptados ao solo e ao clima brasileiro. A primeira medida do governo do Paraná para desestimular o uso do grão contrabandeado foi obrigar o comércio e a circulação de soja a vir acompanhados de certificado atestando a inexistência de sementes transgênicas. A medida foi importante, mas não conseguiu barrar a entrada dos transgênicos no Paraná a partir de 2003. Atualmente o estado está dominado pela semente (no caso da soja e do milho). O princípio da precaução não foi observado no caso do Paraná e do Brasil. As consequências, saberemos no futuro próximo.

IHU On-Line – Hoje a briga contra os transgênicos arrefeceu e já há várias áreas no Estado onde se planta com o uso de sementes transgênicas. O que levou a esta mudança?

Moacir Darolt – A liberação de uso pelo Supremo Tribunal Federal, em 2003, estimulou o plantio de sementes transgênicas no Paraná e no Brasil, a ponto de haver um domínio absoluto das sementes transgênicas, totalizando mais de 90% da área plantada com soja, com tendência similar para o milho. Apenas as áreas próximas a parques e reservas naturais, de agricultores orgânicos ou de produtores convencionais que comercializam produtos livres de transgênicos é que escapam dessa invasão. A liberação levou em conta apenas a questão produtiva e econômica, passando por cima das questões de saúde (houve liberação sem testes definitivos que provassem a segurança dos OGMs) e riscos ambientais; portanto, desconsiderando o que se entende por sustentabilidade, que busca um equilíbrio entre diferentes dimensões (produtiva, econômica, social e ambiental).

As promessas de redução de custos de produção com transgênicos não se confirmaram e hoje quem paga é o produtor, que ficou refém das sementes transgênicas. Para quem deseja produzir livre de transgênicos, o problema é ainda maior, em função de possíveis contaminações desde a lavoura até a limpeza e o armazenamento. O risco é todo por conta do produtor que deseja “ser ecológico”, como os orgânicos! A facilidade de manejo de invasoras com o glifosato, grande trunfo inicial dos transgênicos, vem se perdendo (nesses últimos anos), com o surgimento de problemas com ervas e pragas mais resistentes. Resultado é o uso de mais agrotóxicos! A mudança foi muito boa para a indústria e grandes empresas, mas continua uma incógnita para os produtores e ruim para os consumidores, que são reféns de alimentos transgênicos à base de soja e milho.

IHU On-Line – Ao mesmo tempo, o Paraná é um dos maiores produtores de orgânicos do país. Como convivem estes dois tipos de lavoura? A transgênica, com alto uso de agrotóxicos, e a agroecológica?

Moacir Darolt – Diante do monopólio dos transgênicos, os produtores interessados em produzir no sistema orgânico e mesmo no convencional (livre de transgênicos) podem garantir um mercado interessante, sobretudo para a Europa e países onde os consumidores são mais conscientes. Normalmente, para produtos orgânicos, existe um prêmio médio na venda de 30% a mais em relação ao convencional para compensar os custos — que são maiores, sobretudo em função de maior gasto com mão de obra. A concorrência é desleal, com vantagens para quem usa produtos químicos. Acho que quem polui deveria, no mínimo, pagar por isso, como no caso do poluidor-pagador. Ao contrário, no caso dos orgânicos, poderiam receber um prêmio por serviços ambientais prestados.

Com a supremacia dos transgênicos, quem perde são os consumidores, reféns de uma dieta alimentar baseada em milho, soja, trigo e arroz, mercado dominado por uma dezena de empresas no mundo. Em breve os consumidores poderão não encontrar nas prateleiras de supermercados opções (de milho e soja, por exemplo) sem transgênicos. Produtos à base de amido de milho, por exemplo, muito utilizado para mingau de criança, só serão encontrados na versão transgênica. Isso é um risco não calculado para a saúde dos consumidores.

IHU On-Line – O que é o consumo consciente? Que tipos de pessoas buscam esta alternativa?

Moacir Darolt – Uma alimentação consciente tem relação direta com a forma de produção sustentável, com hábitos alimentares saudáveis e de consumo responsável. Busca mais do que uma alimentação isenta de aditivos químicos, procura observar técnicas de plantio sustentáveis, realçando o problema dos agrotóxicos, dos produtos transgênicos e dos problemas sociais. Observa com atenção os rótulos de produtos industrializados, preocupa-se com a forma de conservação dos alimentos, enfatiza a importância da hora das refeições e da diversidade na elaboração do prato. Em suma, a alimentação consciente preocupa-se com o alimento desde a sua produção até o momento de ser consumido.

As pessoas que buscam essa alternativa, normalmente, são pessoas com bom nível de formação e informação, que fazem suas escolhas alimentares preocupadas com a saúde e com a qualidade de vida, assim como com aspectos ambientais e sociais. Todavia, apenas 5% dos consumidores brasileiros podem ser considerados conscientes. Essas pessoas se diferenciam da maior parte da população por transformar em prática valores com os quais se identificam, têm uma preocupação com a comunidade onde vivem e exercem o seu poder de escolha como consumidores cidadãos.

IHU On-Line – Você acredita que o consumidor e mesmo o produtor paranaense são conscientes do tipo de alimento que consomem ou produzem?

Moacir Darolt – A grande maioria não conhece a procedência do alimento que está levando à mesa. A maior parte dos consumidores e também produtores abastece a sua cozinha em um supermercado, com alimentos prontos e altamente processados, num distanciamento cada vez maior entre quem produz e quem consome. A maioria não sabe que quase todos os derivados de milho e soja consumidos no país já são transgênicos, por exemplo. A letra T em um triângulo amarelo (indicando presença de pelo menos 1% de ingredientes transgênicos) não tem sido eficiente para informar os consumidores. Mesmo em relação a outros alimentos consumidos cotidianamente como hortigranjeiros, a maioria dos produtos a granel não é identificada em relação ao local de origem. Numa cadeia longa, a identidade do alimento (quem produziu? como e onde foi cultivado?) se perde, de modo que a única informação comunicada entre consumidores e produtores é o preço.

Em relação a quem produz, é mais fácil ser um produtor convencional do que ser um orgânico, por exemplo. Um produtor orgânico passa por um rígido processo de certificação e inspeção da propriedade, tudo é fiscalizado. Um produtor convencional não precisa declarar quantas pulverizações fez com agrotóxicos, se está causando erosão do solo ou se planta transgênicos, porque isso é o normal. Nós somos o reflexo de nosso sistema de produção.

A educação para o consumo deveria começar na escola básica, e esse é um dos grandes desafios desse século e uma das premissas para tornar o consumidor protagonista e elemento articulador de mudanças. É preciso acreditar que a capacidade do consumidor em mudar hábitos de consumo tem reflexos em outros segmentos da economia, construindo mercados locais mais fortes.

IHU On-Line – Pensando pelo lado da produção: todo produtor rural é capaz de produzir alimentos de forma alternativa? Existe algum perfil para quem deseja escapar da produção de transgênicos?

Moacir Darolt – Quem busca esse caminho, considero “produtores conscientes”. Normalmente, são produtores inovadores, que buscam conhecer os processos ecológicos envolvidos na sua produção e estão sempre se atualizando. Para quem deseja fazer a conversão de um sistema convencional para um orgânico, é necessário promover a mudança estrutural da propriedade considerando-se alguns aspectos:

1) Informação e treinamento: dizem respeito ao aprendizado, por parte dos agricultores e dos funcionários, dos conceitos e técnicas de manejo que viabilizam a agricultura orgânica;

2) Instruções normativas: as normas da agricultura orgânica precisam ser seguidas para que o produto final possa receber o selo orgânico de qualidade;

3) Ajustes técnicos: pelo menos dois ajustes são fundamentais: o dos insetos, doenças e invasoras (que acontece num período mais curto); e a melhoria da fertilidade do sistema (que é um trabalho de prazo mais longo). O prazo máximo para a conversão é de quatro anos;

4) Aspectos comerciais: sendo um mercado diferenciado, convém que os canais de comercialização sejam definidos anteriormente à produção. O ideal é optar pelos circuitos curtos (feiras, cestas em domicílio, vendas para governo, pequenos mercados) e formar uma clientela fiel.

IHU On-Line – Que dificuldades um produtor que opta pela produção alternativa enfrenta tendo em vista financiamento, qualidade do solo, distribuição e outros elementos da cadeia produtiva?

Moacir Darolt – No Brasil todo agricultor enfrenta dificuldades, sobretudo os pequenos produtores familiares. Em todo caso, seguem algumas sugestões para quem quer produzir organicamente e minimizar os problemas: visite outras experiências bem-sucedidas na sua região ou proximidades antes de começar a produzir e escolha uma cultura ou criação que tenha afinidade; saiba que a fase mais difícil é o período de conversão, que pode durar de um a quatro anos, por isso, tenha uma reserva financeira e faça um bom planejamento nesta fase inicial, quando os produtos ainda não podem ser vendidos como orgânicos; siga corretamente as normas de produção, processamento, envase e comercialização da produção orgânica; tenha um bom controle administrativo e planejamento técnico de sua produção; saiba que a transformação agrega valor ao produto e aprenda a comercializar parte de sua produção de forma direta; faça contato com associações ou grupos de produtores orgânicos da sua região, tentando fazer um trabalho de divulgação em conjunto para venda e promoção da produção; tenha pelo menos dois a três canais de comercialização, preferentemente de venda direta, fazendo uma boa investigação dos melhores canais antes de começar a produzir; dê preferência à certificação participativa ou à certificação por auditoria em grupos, que tem custo mais acessível.

IHU On-Line – Existe espaço mercadológico para esta produção alternativa? É possível escoar a produção, ou é uma opção mais indicada para a segurança alimentar?

Moacir Darolt – O espaço para esse tipo de produção é crescente. A tendência é de valorização dos produtos ecologicamente corretos, tanto que tem despertado o interesse econômico de empresas do “negócio verde ou biobusiness”, que se organizam em todo o planeta. É notório o espaço para a produção ecológica também em escala. Do outro lado, cada vez mais agricultores familiares, comunidades rurais e pequenas cooperativas de produtores defendem uma agricultura tradicional e tipos de sistemas agroecológicos que privilegiem a produção com uma dimensão humana, respeitando a biodiversidade e a soberania alimentar. Esse embate entre a produção industrial e a artesanal ou tradicional é uma disputa política que impõe regras na qual os pequenos produtores tradicionais encontram dificuldades em responder às exigências legais em termos de estrutura sanitária e aspectos fiscais, por exemplo.

É incoerente aplicar critérios semelhantes para a produção em larga escala e a produção artesanal, visto que as práticas tradicionais de produção de alimentos estão enraizadas socialmente e vinculadas a uma cultura e um modo de vida específico. Assim, a melhor alternativa para produtores familiares é optar por circuitos curtos de comercialização, mercados locais e de proximidade. Existem várias alternativas, como feiras do produtor, lojas especializadas, programas de governos, merenda escolar, restaurantes, vendas na propriedade, vendas em circuitos de turismo rural, entregas em domicílio, além de lojas virtuais pela internet.

IHU On-Line – Você acredita que a produção orgânica ou agroecológica é capaz de substituir a produção convencional?

Moacir Darolt – Pelas projeções mundiais de crescimento da produção orgânica, que ainda é muito baixa (cerca de 2% das áreas cultivadas no mundo são orgânicas), tão logo não deve haver substituição, mas pode haver uma complementariedade e dar oportunidades de escolhas às pessoas para que tenham uma melhor qualidade alimentar. Não podemos ficar reféns do modelo industrial de agricultura, que padroniza sabores, diminui a diversidade biológica e destrói nossa cultura alimentar. Nosso desafio é saber de fato qual o papel dos produtores, dos consumidores e do estado (como regulador) nessa busca por um alimento de qualidade. Será preciso criatividade para manter as especificidades e diversidade dos produtos de cada região agrícola, evitando uma padronização e preservando os valores, a cultura e a tradição de cada local.

IHU On-Line – Deseja acrescentar mais alguma coisa?

Moacir Darolt – Aderir a uma cadeia alimentar curta talvez seja a melhor garantia da qualidade de um alimento limpo, saudável e justo. Não há dúvida de que isso irá exigir mais esforço de produtores e consumidores, mas está em jogo a nossa saúde e a preservação da nossa cultura alimentar.


Fonte: EcoDebate

terça-feira, 26 de novembro de 2013

A geração ‘nem-nem’: juventude sem perspectiva? Artigo de José Eustáquio Diniz Alves
[EcoDebate] O Brasil passa pelo processo da transição demográfica, com a consequente mudança na estrutura etária. O número de crianças e jovens de 0 a 24 anos tem diminuído, tanto em termos absolutos, quanto em termos relativos. Ao mesmo tempo, tem crescido a parcela da população em idade de trabalhar, de 25 a 64 anos. Isto quer dizer que há um processo de redução da razão de dependência, abrindo uma janela de oportunidade demográfica para o avanço da qualidade de vida e para resolver os problemas sociais mais candentes da juventude.

Segundo o demógrafo americano Richard Easterlin “coortes menores tendem a ter melhores oportunidades no mercado de trabalho e na educação”. Portanto, o Brasil, que vive a fase do bônus demográfico, tem uma chance única de avançar com a inclusão social de seus adolescentes e jovens.

Porém, existe uma parte dos jovens brasileiros que nem trabalham e nem estudam. É a chamada geração nem-nem. Quanto maior o número de jovens fora da população economicamente ativa (PEA) e fora da escola, menores são os benefícios do bônus demográfico.

Segundo estudo das demógrafas Ana Amélia Camarano e Solange Kanso, do IPEA, existiam 8,1 milhões de jovens (de 15 a 29 anos) que estavam fora da escola e do mercado de trabalho em 2000 (16,9% da população jovem), atingindo 8,8 milhões (17,2%) em 2010.

Segundo as autoras “Esse crescimento foi diferenciado por sexo. Enquanto o contingente masculino aumentou em 1.107 mil pessoas, o de mulheres diminuiu em 398 mil. Do total de homens jovens, 11,2% encontravam-se na condição de não estudar e não trabalhar em 2010. Entre as mulheres, o percentual foi bem mais elevado, 23,2%, apesar do percentual de homens ter aumentado e o de mulheres diminuído. Do total de jovens que não estudavam e não participavam do mercado de trabalho, 67,5% era composto por mulheres, embora esta participação venha decrescendo desde os anos 1980” (p. 38).

Ainda de acordo com o estudo do IPEA, aproximadamente dois terços das mulheres que não estudavam e não trabalhavam eram casadas e 61,2% já tinham filhos em 2010. Portanto, eram mulheres que dedicavam a maior parte do seu tempo aos afazeres reprodutivos, que não são contabilizados nas Contas Nacionais.

Muitas dessas mulheres engravidaram por não terem alternativas de progresso social e por não terem acesso aos métodos de regulação da fecundidade. Estas mulheres sofrem com o círculo cumulativo da falta de direitos: no trabalho, na educação e na falta de acesso aos direitos sexuais e reprodutivos.

O crescimento do número de homens que não estudam e não trabalham é também preocupante, pois além de ser um desperdício do potencial humano, em termos macroeconômico, reflete a falta de oportunidade de trabalho decente, que é um direito humano básico.

O crescimento do número de jovens “nem-nem” entre 2009 e 2012 é um fato não previsto, pois 2009 foi ano de recessão econômica, mas os anos de 2010 a 2012 apresentaram crescimento do PIB e isto deveria ter aberto oportunidades para os jovens na escola e no mercado de trabalho. Cerca de 40% das moças de 15-24 anos e 25% dos moços estavam fora da PEA e da escola, em 2012, segundo dados da PNAD (percentual bem mais elevado do que o indicado pelo censo demográfico).

Existem diversas pessoas que dizem que o Brasil, devido à queda nas taxas de fecundidade, passaria por um processo de “apagão de mão de obra”. Contudo, estes dados sobre a geração “nem-nem” mostram o quanto o Brasil está distante de atingir a situação de pleno emprego e de engajar sua juventude em atividades que sejam engrandecedoras dos indivíduos e de uma nação justa, prospera e ambientalmente sustentável.

O número absoluto de jovens está diminuindo no Brasil. Este é o momento para se investir nos direitos da juventude, permitindo que façam a transição para a vida adulta de maneira tranquila, saudável e produtiva. O futuro do país depende da inserção social e da boa qualidade de vida das novas gerações.
Referências:

ALVES, JED. Fecundidade, Cidadania e Políticas de Proteção Social e Saúde Reprodutiva no Brasil, Seminário Internacional “Saúde, Adolescência e Juventude: promovendo a equidade e construindo habilidades para a vida”, Ministério da Saúde e UNFPA, Brasília, 17/11/2013

ALVES José Eustáquio Diniz & CAVENAGHI, Suzana. O Programa Bolsa Família e as Taxas de Fecundidade no Brasil. In: Programa Bolsa Família : uma década de inclusão e cidadania /organizadores: Tereza Campello, Marcelo Côrtes Neri. – capítulo 14 Brasília : Ipea, pp: 233-2452013.

José Eustáquio Diniz Alves, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em demografia e professor titular do mestrado em Estudos Populacionais e Pesquisas Sociais da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE; Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal. E-mail: jed_alves@yahoo.com.br


Fonte: EcoDebate

Pré Conferência UERJ - Movimento Pró Saneamento

segunda-feira, 25 de novembro de 2013

Agricultores do Paraná que preservam rios e florestas serão recompensados
Uma parceria inédita no Brasil será firmada nos próximos dias entre o Governo do Paraná e a Agência Nacional de Águas (ANA) para implementar no Estado o Pagamento por Serviços Ambientais (PSA) em propriedades rurais localizadas em áreas de mananciais de abastecimento público.

Com isso, o Programa Bioclima – desenvolvido pela Secretaria do Meio Ambiente e Recursos Hídricos com o objetivo de promover a conservação da biodiversidade e conter os efeitos das mudanças climáticas – passará a replicar no Paraná as ações do Programa Produtor de Águas, da ANA. Esta será a primeira vez em 12 anos que a Agência Nacional de Águas irá descentralizar para um estado recursos financeiros e capacitação técnica com o intuito de estimular a política de Pagamento por Serviços Ambientais voltados à proteção hídrica no Brasil.

O anúncio da parceria aconteceu nesta quinta-feira (07), em Curitiba, durante o I Encontro Técnico de Programas Estaduais de PSA, realizado pela Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza.

“Assim como o Programa Bioclima Paraná, o programa Produtor de Águas tem como principal ferramenta de incentivo à conservação da qualidade e quantidade da água dos rios, a compensação financeira para agricultores que prestam serviços ambientais para a sociedade. O Paraná começará a pagar os agricultores em breve e estamos trazendo uma proposta que irá incrementar ainda mais esta iniciativa”, afirmou o gerente de Uso Sustentável da Água e do Solo da Agência Nacional de Águas, Devanir dos Santos.

Segundo ele, a iniciativa do Programa Bioclima e do Programa Produtor de Água de remunerar os produtores rurais que preservam nascentes e florestas segue uma tendência mundial. “É transformar os agricultores em agentes de preservação ambiental”, disse. Santos explicou que os custos da implantação de práticas e manejos sustentáveis não podem ficar restritos ao agricultor, uma vez que os benefícios dessas ações ultrapassam as fronteiras das propriedades. “Os ganhos não são somente dos produtores e, portanto, é justo a distribuição de custos entre eles e toda a sociedade”, completou.

ACORDO – Nos próximos dias, o governador Beto Richa e o presidente da Agência Nacional de Águas, Vicente Andreu, devem assinar um acordo de cooperação técnica em que a Agência Nacional de Águas transfere a titularidade da execução do Programa Produtor de Águas, no Paraná, para a Secretaria do Meio Ambiente, por meio do Programa Bioclima.

O secretário do Meio Ambiente e Recursos Hídricos, Luiz Eduardo Cheida, explica que a parceria só poderá ser concretizada devido ao andamento do Programa Bioclima.

“O Paraná possui uma política de conservação com capacidade de receber e absorver este programa da ANA, que já é referência internacional”, avalia Cheida.

O secretário acrescenta que com o acordo de cooperação o Paraná receberá recursos da ANA para fazer o diagnóstico das sub-bacias hidrográficas onde o Pagamento por Serviços Ambientais hídrico será implementado, bem como capacitação técnica para funcionários e arranjos institucionais locais nos municípios.

PROJETO PILOTO – O local para o projeto piloto de Pagamento por Serviços Ambientais da Água já foi escolhido. Será na microbacia do rio Miringuava, localizada na área rural de São José dos Pinhais, na Região Metropolitana de Curitiba, onde a Sanepar vai construir um novo reservatório.

“Nada mais justo do que compensar os proprietários que ajudam a conservar a água que beneficiará toda a população”, destaca Cheida. Ele explica que o Governo do Paraná está invertendo a lógica da preservação. Em vez de apenas punir quem degrada o meio ambiente, vai bonificar quem age corretamente.

O trabalho na microbacia do Miringuava já começou como parte do Programa Bioclima e somará ações do Programa Produtor de Águas. Lá existem 500 propriedades rurais que estão sendo avaliadas por meio de um diagnóstico realizado pela Secretaria do Meio Ambiente e pela Sanepar. O documento inclui informações hidrológicas, sociais, econômicas e ambientais como, por exemplo, a qualidade água do rio que corta as propriedades e as práticas agrícolas utilizadas.

Após esta etapa, será feito um projeto base com as intervenções necessárias para garantir a qualidade da água e aumentar a quantidade. O projeto também indicará o valor de recursos necessários para que cada proprietário consiga manter práticas sustentáveis. A etapa final prevê a publicação de um edital de chamamento para os agricultores que tiverem interesse de se cadastrar voluntariamente e, depois, assinar, o contrato de Pagamento por Serviços Ambientais com o Governo do Estado.

A Agência Nacional de Águas trará a sua experiência como o Programa Produtor de Água que visa a redução da erosão e assoreamento dos mananciais nas áreas rurais. O programa, de adesão voluntária, prevê o apoio técnico e financeiro para ações de conservação da água e do solo como, por exemplo, a recuperação e proteção de nascentes, o reflorestamento de áreas de proteção permanente e reserva legal e o saneamento ambiental.

A concessão dos incentivos ocorre somente após a implantação, parcial ou total, das ações e práticas conservacionistas previamente contratadas. Já os valores a serem pagos são calculados de acordo com os resultados: abatimento da erosão e da sedimentação, redução da poluição difusa e aumento da infiltração de água no solo.

O diretor-geral da Secretaria do Meio Ambiente e coordenador do Programa Bioclima Paraná, Caetano de Paula Júnior, conta que a meta é implementar o Pagamento por Serviços Ambientais hídrico em outras três microbacias já em 2014.

“Ao desenvolver um sistema de PSA, o programa Bioclima Paraná tem como garantir a manutenção dos recursos hídricos e irá fomentar a manutenção das áreas de florestas existentes”, afirma Caetano.

Segundo ele, a metodologia e os critérios que os agricultores deverão seguir para se enquadrar no PSA de água e no PSA de florestas – que vai pagar para os agricultores que possuem remanescentes florestais conservados em suas propriedades – está sendo finalizado e será entregue até o dia 30 de novembro pelo Fundo Brasileiro para Biodiversidade (FUMBIO) à Secretaria do Meio Ambiente.

Com essa ferramenta será possível determinar o valor a ser repassado, referente a três categorias – biodiversidade, reservas particulares do patrimônio natural (RPPNs) e conservação de recursos hídricos.

O ENCONTRO – O I Encontro técnico de programas estaduais de Pagamento por Serviços Ambientais, realizado pela Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza teve o objetivo de discutir o mecanismo de Pagamento por Serviços Ambientais (PSA) como estratégia para a conservação da biodiversidade na esfera estadual. No encontro foram abordados requisitos, normas, critérios, cálculos, recursos financeiros, responsáveis e marcos legais.

Apresentaram seus programas os estados de Goiás, Pará, Paraná, Santa Catarina, São Paulo, e Tocantins.
Informe da Secretaria do Meio Ambiente e Recursos Hídricos – PR


Fonte: EcoDebate

sexta-feira, 22 de novembro de 2013

Olá pessoal;

Para o conhecimento de todos e possíveis mobilizações, em anexo convites de uma Conferência Sobre Saneamento Básico para a Baixada Fluminense e uma Consulta Pública sobre Recursos Hídricos.

Ambos encontros são importantes a participação da sociedade, para o melhor encaminhamento das ações dos gestores públicos.

Saudações socioambientais
Gilvoneick Souza
                                                              
‘O trabalho escravo foi um dos pilares de nossa economia, por isso nos custa tanto erradicá-lo’. Entrevista com José Armando Fraga Diniz Guerra

Coordenador Geral da Comissão Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo (CONATRAE), José Guerra foi entrevistado pela A Rel sobre o problema e a dimensão do trabalho escravo no Brasil. Um flagelo que nunca acaba.



               Foto: Gerardo Iglesias

-Como o senhor contextualiza o problema do trabalho escravo no Brasil atualmente?

-Vamos fazer um resumo histórico: No Brasil, a primeira denúncia de trabalho escravo data da década de 1970, quando o país passava por uma etapa ditatorial e tinha uma política de expansão colonizadora para a região amazônica e, nesse processo, surgiram várias denúncias sobre trabalho escravo.

O Estado brasileiro demorou duas décadas para dar solução a esta situação. Somente em 1990 é que o então presidente Fernando Henrique Cardoso começou a gerar algumas estruturas estatais para combatê-lo.

Em 1995 já haviam sido liberados 45 mil trabalhadores e houve um avanço no que se refere à conceituação do trabalho escravo contemporâneo.  Passou-se de uma situação apenas de restrição da liberdade para uma que também considere o ataque à dignidade do trabalhador.

Portanto, “condições degradantes de trabalho” e “jornadas extenuantes” foram termos que passaram a fazer parte do conceito de trabalho escravo, da mesma forma que o respeito às condições de alimentação, de moradia, de higiene e de tratamento dignos.  Estes conceitos fazem parte do texto que ainda está vigente, recebendo um forte reconhecimento por parte das organizações internacionais, entre elas, a OIT e a ONU.

Atualmente, este conceito de trabalho escravo, que é muito avançado, é o que rege no país, conjuntamente com una consciência estatal de combate ao trabalho escravo, porém cotidianamente somos surpreendidos pelas mudanças nas modalidades de trabalho escravo.

Hoje em dia no Brasil nos deparamos com o trabalho escravo urbano, vinculado à imigração, afetando na maioria das vezes os trabalhadores estrangeiros e em setores da produção que apresentam uma enorme terceirização como, por exemplo, a indústria têxtil e a construção civil.

Então, a política pública brasileira tem que ir se adequando e evoluindo a partir dos resultados da atuação estatal no combate ao trabalho escravo. Temos um sistema que funciona, entretanto temos que ter, hoje mais do que nunca, a consciência do que é o fenômeno do trabalho escravo no Brasil.

É possível considerar que, em termos exponenciais, o trabalho escravo se dê em uma minoria dos setores da produção, mas justamente devido ao tamanho da dinâmica da economia brasileira, trata-se de um número considerável de trabalhadores que passam por essa situação e também são montantes consideráveis de dinheiro gerados pelas empresas que se valem das práticas do trabalho escravo.

-Por que, para o senhor, o Brasil demorou tanto em abolir a escravidão?

-Historicamente, toda a sociedade brasileira, ao contrário de outras sociedades do novo mundo (América) tinha o trabalho escravo como parte fundamental do progresso econômico do Brasil colônia.

Inicialmente, tentaram escravizar os indígenas, mas isto não deu certo, então trouxeram contingentes de africanos para o trabalho escravo. Esta é uma das razoes pelas quais o Brasil é um dos países da América Latina com uma alta taxa de população afrodescendente. Infelizmente, um dos pilares da economia do país era o trabalho escravo e, possivelmente, por isto, nos custou tanto erradicá-lo.

Em que pese a Lei Aurea (1888) ter sido proclamada, foram precisos mais 60 anos para que as práticas de trabalho escravo fossem abolidas de fato.

Só a partir do governo de Getúlio Vargas é que foi criada uma legislação trabalhista, mas essa legislação abrange apenas os trabalhadores da cidade, porque, para os trabalhadores rurais, foram necessários quase 80 anos para que vissem os seus direitos trabalhistas equiparados ao restante dos trabalhadores e, para o serviço doméstico, foram precisos mais 125 anos, pois só agora começamos a regulamentá-lo no Brasil. Caminhamos muito atrasados em termos de direitos trabalhistas, o trabalho no Brasil é muito desvalorizado e, apesar dos avanços em termos legislativos, estamos ainda de fraldas no que se refere à legislação trabalhista.

-A matriz escravagista ainda está presente no DNA deste capitalismo agropecuário brasileiro…

-Sim, é correto. Está, como você diz, em seu DNA. Quando aqui em meu país lutamos contra o trabalho escravo, estamos lutando contra a nossa história, por isso é tão difícil, porque se trata de uma disputa cultural.

Por outro lado, atualmente muitos estabelecimentos agropecuários, os mesmos que contratam pessoal pouco qualificado, também empregam técnicos altamente qualificados para o manuseio e a manutenção de maquinaria de última tecnologia.

A demanda econômica brasileira levou estes setores a se modernizarem em termos de tecnologia, mas infelizmente essa modernização não está compassada com o progresso do pensamento e é aí que vemos surgir, em pleno século XXI, situações típicas da idade média.

-…Com cartões postais do século XVI…
-Correto. Em um mesmo canavial veremos como se chocam condições de trabalho medievais com condições de trabalho do século atual.

-A OIT, em um relatório sobre o trabalho escravo no Brasil, mencionava que o país é muito grande, com distâncias enormes, ainda que a maior distância seja a existente entre o lucro desenfreado e o respeito aos direitos humanos básicos…

-Frequentemente somos acusados de colocar paus na roda do setor produtivo, quando na realidade o que fazemos é o contrário, porque garantindo os direitos dos trabalhadores, as suas condições de trabalho e os seus salários é que promovemos uma economia sustentável.

Estamos sendo acusados por defender una proposta de expropriação de terras onde for encontrado o trabalho escravo. Se obtivermos essa medida, o que estaremos fazendo é valorizar a propriedade privada, porque se expropriarmos essa minoria de propriedades que não respeita os direitos humanos, a grande maioria ficará fortalecida e esse é o diálogo social que queremos instaurar.

No Brasil temos 1 por cento de escravagistas que mancham o resto dos produtores e a própria produção do país.

O que estamos tentando fazer é separar o joio do trigo para deixar clara a nossa postura de que, por um lado, existe uma produção que garante os direitos humanos e ambientais dos trabalhadores e, por outro, existe uma produção baseada no conceito da pura exploração humana.

-Qual é a sua postura diante desta proposta de regulamentação da PEC 57-A?

-Temos uma visão muito próxima à da CONTAG, acreditamos que esta proposta de regulamentação é primária e como tal tem que evoluir, avançar em três pontos fundamentais. Em primeiro lugar, que o conceito de trabalho escravo deva ser mantido da mesma forma como está no Código Penal.

Em segundo lugar, da forma que está atualmente redigida a proposta, está previsto que as terras ou os imóveis a serem expropriados serão apenas aqueles onde for constatada a exploração feita diretamente pelo proprietário do imóvel, mas a economia é bem mais complexa.

Na cadeia produtiva estão os serviços terceirizados, os comandos médios contratados pelo proprietário para que façam o seu trabalho, então não necessariamente o proprietário tem que estar presente com o chicote na mão para ser o responsável pelas condições de seus trabalhadores.

E o terceiro ponto se refere à necessidade de sentença condenatória para que a terra seja expropriada. Em nossa opinião, temos um grande problema com esse ponto, não apenas por uma questão de tempos, já que os processos judiciais geralmente são muito lentos, mas porque, em muitos casos, é encontrado trabalho escravo em propriedades que estão no nome de empresas e o código penal no Brasil não prevê a condenação criminal desta figura jurídica, inviabilizando a expropriação.

Então, haveria uma dissociação entre os exploradores, pois as pessoas físicas seriam plausíveis de expropriação enquanto que as empresas que não o seriam.

Se conseguirmos manter estes pontos, a PEC será positiva para o avanço no combate ao trabalho escravo, mas pelo contrário, se for aprovada agora como está, significará um grave retrocesso nesse sentido.

-Como o senhor avalia o trabalho de denúncia que a CONTAG e A Rel UITA estão desenvolvendo?

-Me parece correto, principalmente porque induz ao diálogo a partir da diversidade de posturas. A CONTAG, como participante da Comissão Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo, é uma grande aliada nesta luta e esta parceria tem se demonstrado no trabalho diário que vem sendo desenvolvido com relação à PEC 57-A.

Entrevista socializada pela Regional Latino-Americana da UITA


Fonte: EcoDebate