Saneamento básico no Brasil: ‘Um
cenário alarmante’. Entrevista com Édison Carlos, Instituto Trata Brasil
“O governo federal pretende universalizar o
saneamento básico no Brasil em 20 anos (2014 a 2033) e para isso estima a
necessidade de 302 bilhões de reais somente para obras de água e esgotos.
Teríamos de investir em média 15 a 16 bilhões/ano, mas ainda não passamos dos 9
bilhões de reais por ano”, adverte o presidente executivo do Instituto Trata
Brasil.
Foto: http://bit.ly/GJJ1fG
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A situação do saneamento básico no Brasil é
“alarmante” e compromete “a meta do governo federal de universalizar o
saneamento em 20 anos”, diz Édison Carlos, ao comentar os dados do Ranking
do Saneamento realizado pelo Instituto Trata Brasil, o qual avalia a
situação do saneamento e da água nas 100 maiores cidades brasileiras. Segundo
ele, em 2011, as 100 maiores cidades do país “geraram mais de 5,1 bilhões de m³
de esgoto. Desses, mais de 3,2 bilhões de m³ não receberam tratamento.
Significa que as 100 maiores cidades jogaram cerca de 3.500 piscinas olímpicas
de esgoto por dia na natureza”.
Apesar do cenário preocupante, o presidente
Executivo do Instituto Trata Brasil assegura que houve avanços na última
década, principalmente no acesso à água potável. Nas 100 cidades monitoradas,
92,2% da população tem acesso à água tratada, “bem acima da média nacional —
que é de 82,4%”. Em relação à coleta de esgotos, os dados são mais precários.
“Chega a 61,40% da população nas 100 maiores cidades e a 48,1% no país.
Significa que mais de 100 milhões de brasileiros ainda não possuem esse serviço
mais básico”, assinala em entrevista concedida à IHU On-Line por e-mail.
De acordo com ele, os investimentos do PAC
destinados para melhorias do saneamento básico ainda não foram utilizados na
sua totalidade. “O Trata Brasil monitora 138 obras de esgotos do PAC,
e constatamos que somente 14% delas estão prontas após cinco anos. A maioria,
65% das obras, está atrasada, paralisada ou sequer começou”, lamenta.
Édison Carlos é químico industrial graduado pelas Faculdades
Oswaldo Cruz e pós-graduado em Comunicação Estratégica. Atuou por quase 20
anos em várias posições no Grupo Solvay, sendo que, nos últimos anos,
foi responsável pela área de Comunicação e Assuntos Corporativos da Solvay
Indupa. Em 2012, Édison Carlos recebeu o prêmio “Faz Diferença –
Personalidade do Ano”, do Jornal O Globo – categoria “Revista
Amanhã”, que premia quem mais se destacou na área da Sustentabilidade em
todo o país.
Confira a entrevista
Foto: http://bit.ly/1afV9N1
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IHU On-Line – Como foi elaborado o Ranking do
Saneamento realizado pelo Instituto Trata Brasil? Quais as principais
constatações em relação ao saneamento básico nas 100 maiores cidades
brasileiras?
Édison Carlos - O Ranking do Saneamento do Instituto Trata
Brasil é elaborado a partir de dados do Sistema Nacional de Informações
sobre Saneamento – SNIS, do Ministério das Cidades, que fornece
anualmente os números de abastecimento de água, coleta e tratamento de esgoto,
perdas de água, investimentos e outros; todos estes providos das próprias
empresas ou municípios operantes. Vale ressaltar que o Ministério das
Cidades divulga números com dois anos de defasagem, ou seja, os dados
fornecidos este ano — e consequentemente usados para o Ranking do Instituto
Trata Brasil — são de 2011. Com os números do SNIS, a GO
Associados, parceira do Trata Brasil, se encarrega de elaborar o
método que definirá a posição de cada município.
As principais constatações são preocupantes, e a
lenta evolução dos indicadores nas grandes cidades compromete a meta do governo
federal de universalizar o saneamento em 20 anos. Nós temos um cenário
alarmante no Brasil, mesmo em grandes capitais, como Macapá, Belém,
São Luís, Teresina, Natal, entre outras, onde os serviços
de coleta e tratamento de esgoto ainda são muito precários.
Em 2011, as 100 maiores cidades geraram mais de 5,1
bilhões de metros cúbicos (m³) de esgoto. Desses, mais de 3,2 bilhões de m³ não
receberam tratamento. Significa que as 100 maiores cidades jogaram cerca de
3.500 piscinas olímpicas de esgoto por dia na natureza.
IHU On-Line – Em que estados se concentram as
cidades em que há melhor e pior condições de saneamento?
Édison Carlos - São Paulo, Minas Gerais e Paraná
são os estados que têm números expressivos de municípios, mais especificamente 18
entre as 20 melhores cidades no ranking. Em contrapartida, as regiões Norte e
Nordeste, no geral, têm os piores índices, principalmente o estado do Pará, que
contém seus três grandes municípios (Belém, Santarém e Ananindeua) nas cinco
últimas posições, além de Amapá, Pernambuco e Maranhão. Apesar de estar no
Sudeste, o estado do Rio de Janeiro também possui algumas cidades da Baixada
Fluminense entre as piores do país.
IHU On-Line – Que percentual da população
brasileira é atendida com água tratada e coleta de esgoto?
Édison Carlos - Nas 100 maiores cidades monitoradas pelo Instituto
Trata Brasil, são 92,2% da população que têm atendimento em água tratada,
bem acima da média nacional — que é de 82,4%. Já a coleta de esgotos chega a
61,40% da população nas 100 maiores cidades e a 48,1% no país. Significa que
mais de 100 milhões de brasileiros ainda não possuem esse serviço mais básico.
IHU On-Line – Qual o destino dado ao esgoto gerado
pelas 100 maiores cidades brasileiras?
Édison Carlos - Estas 100 maiores cidades, em 2011, geraram mais
de 5,1 bilhões de m³ de esgoto; mais de 3,2 bilhões de m³ não receberam
tratamento, isto é, as 100 maiores cidades jogaram cerca de 3.500 piscinas
olímpicas de esgoto por dia na natureza. São lançamentos de esgotos em córregos,
rios e lagos, a céu aberto ou em fossas rústicas que, se não cuidadas, geram
contaminação nos lençóis freáticos.
IHU On-Line – Que avanços foram possíveis constatar
no setor de saneamento desde 2003?
Édison Carlos - Houve avanços, principalmente no acesso à água
potável, mas muito pouco em coleta e tratamento dos esgotos. Quase nada se
avançou também na redução das perdas de água.
Os investimentos do setor federal, através do Programa
de Aceleração e Crescimento – PAC, por exemplo, ainda não conseguiram ser
usados em sua totalidade. O Trata Brasil monitora 138 obras de esgotos
do PAC, e constatamos que somente 14% delas estão prontas após cinco
anos. A maioria, 65% das obras, está atrasada, paralisada ou sequer começou.
IHU On-Line – Quais são as metas do Plano Nacional
de Saneamento Básico – PLANSAB para 2030? A partir da pesquisa realizada pelo
Instituto Trata Brasil, quais as expectativas na tentativa de alcançar a meta
do PLANSAB?
Édison Carlos - O governo federal pretende universalizar o
saneamento básico no Brasil em 20 anos (2014 a 2033) e, para isso, estima a
necessidade de 302 bilhões de reais somente para obras de água e esgotos.
Teríamos de investir em média 15 a 16 bilhões/ano, mas ainda não passamos dos 9
bilhões de reais por ano. Precisamos, portanto, investir o dobro para atingir a
universalização que o governo federal propõe. O PLANSAB exige que os
municípios entreguem um plano de saneamento até dezembro deste ano, porém
sabemos que muitos prefeitos não irão cumprir com o pedido, dessa forma, estas
cidades poderão não mais receber recurso federal para novas obras. Quem perde
com isso é o cidadão.
IHU On-Line – Quais são as principais dificuldades
para alcançar a meta de universalizar o saneamento básico em 20 anos no Brasil?
Édison Carlos - Primeiramente, saneamento básico tem que ser
prioridade número 1 dos entes públicos e da população. Devido aos 20 anos que o
país passou sem recursos para esgotamento sanitário, criou-se um grande déficit
nestes serviços. Hoje o setor enfrenta dificuldade por conta da gestão dos
municípios e da atuação das empresas de saneamento na elaboração de projetos,
no uso dos recursos, ao mesmo tempo em que há uma grande burocracia para a
chegada dos recursos federais às obras, dificuldade e lentidão nas licenças ambientais
e despreparo das prefeituras para com essas obras.
IHU On-Line – Quais são hoje as principais
políticas públicas federais para garantir melhorias no tratamento da água e
melhores condições de saneamento básico?
Édison Carlos - O governo federal, em 2007, sancionou a lei de Diretrizes
Nacionais para o Saneamento Básico (nº 11.445, de 5 de janeiro de
2007). Esta lei preconiza que todos os municípios precisam elaborar seus Planos
Municipais de Saneamento Básico e promover a Regulação dos Serviços de Saneamento.
Estes são instrumentos de planejamento fundamentais para que as cidades
organizem seu futuro no campo sanitário. Infelizmente, a implementação dessas
diretrizes está muito lenta no país.
IHU On-Line – Deseja acrescentar algo?
Édison Carlos – Em 2014 temos eleições, e é momento de o
brasileiro manifestar sua vontade de que esta realidade mude. Temos que cobrar
soluções de nossos candidatos a deputado, senador, governador e presidente.
Somente através da mobilização conseguiremos mostrar que saneamento é
importante.
Fonte: Ecodebate
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